A Capela de Sant’ana da Chapada

25 de Junho de 2012
Alex Bohrer

Alex Bohrer

Herdeira da primeira arquitetura religiosa implantada pelos exploradores pioneiros, a capela da Chapada é remanescente importante do patrimônio histórico edificado do atual município de Ouro Preto. Em Chapada, contudo, a pequena capela se insere em contexto mui específico: a ermida que domina a paisagem urbana - como é típico das aglomerações coloniais - conservou em torno de si um arruamento caracteristicamente primitivo, típico, quiçá, dos primórdios da ocupação mineradora. Ainda que o casario, muitas vezes retocado e modificado através dos tempos, não seja, certamente, o original, mas uma ‘mistura’ de várias épocas, o arruamento é de desenho antigo, calçado rudimentarmente, em grande parte gramado e irregular. O pequeno povoado da Chapada legou aos pósteros esse casario e a Capela de Sant’Ana, magnificamente emoldurados pela paisagem natural circundante.

Antigas estradas ou vias de acesso à sede colonial mineira cruzavam estas paragens. O lugarejo se encontra a poucos quilômetros de algumas dessas estradas principais, cujo entroncamento dava início aos afamados caminho novo e caminho velho, pontos de convergência das Estradas Reais em Minas. Nas proximidades da Chapada ainda existem vestígios destes caminhos, com algumas pontes e outros vestígios.

A Capela de Sant’Ana possui arquitetura simples com uma pequena nave, uma capela-mor (formando dois corpus distintos ligados pelo arco-do-cruzeiro), telhado de duas águas. Chama atenção na fachada principal a torre sineira desprendida da edificação, à direita, com telhadinho piramidal, e a curiosíssima portada em pedra-sabão. Mesclando concepções populares, técnicas e simbologia religiosa, esta portada, executada em 1883, é fruto da fé de esmoleres. Totalmente afastado - temporal e espacialmente - das fachadas rococós e mais “livre” dos cânones europeus de arquitetura e ornamentação, o artista desta portada pôde conceber uma obra original em sua essência.

Encima o medalhão da portada uma cruz de feição bastante diversa, colocada na parede. Em baixo se encontram símbolos da Santa-Sé - entre eles os símbolos papais (materializados nas chaves de São Pedro, entrecruzadas, signo maior do Vaticano) e as mitras pontificais, cardinalícias e episcopais. A inscrição central reza: “ANNO 1883 POR AS SANTANA ESMOLAS”. Diz respeito, portanto, à ação dos esmoleres citados. Mais abaixo, em meio a ornatos variados, se encontra uma lança circundada, pelo lado direito, por um cálice, e, pelo lado esquerdo, por um coração. A simbologia é clara e não demanda maior erudição: O cálice representa o Sangue de Cristo, a lança significa a traspassação, que fez o sangue jorrar na cruz, e o coração, ferido aqui por um cutelo, representa o martírio cristológico. Sob a portada, de feição única e totalmente fora dos padrões convencionais da época, se encontra a porta com seus cunhais e verga. A “verga” é composta de duas espécies de “sobrancelhas” que dão continuidade aos cunhais e se dobram em direção ao centro.

O altar-mor desta capela é composto de elementos de diversas épocas, desde o rococó. As várias partes constituintes foram reagrupadas (provavelmente em 1883) segundo um gosto mais ‘clássico’. Neste altar, cabe salientar a presença de cabeças de anjos, sob os consolos dos nichos, de fatura excelente. A nave é simples, com dois altares laterais (mais recentes), balaustradas e coro. No lugar esperado do púlpito (que aqui inexiste) há um curioso e antigo relógio. Sob o coro há uma pia batismal talhada. Corredores laterais, partindo da capela-mor, conduzem à sacristia, nos fundos. Pinturas interessantes encimam a capela-mor (Santa Ana ensinando Maria) e a nave (Maria com Cristo morto, sob a cruz). Muito repintadas, deixam entrever, contudo, uma confecção de fins do século XIX ou início do XX. Na capela-mor há ornamentos parietais pintados imitando ‘papel-de-parede’.

Há que se dizer algo também sobre os bens móveis do templo, como o mobiliário, mais simplificado, e a imaginária expressiva, com peças de épocas diversas. Destaque para a imagem da padroeira, Sant’Ana, tombada pelo IPHAN em 1987, depois de sua atribuição ao Aleijadinho. Esta peça apresenta, sem dúvida, todos atributos do mestre maior do Barroco Mineiro.

É, por tudo isso, a Capela de Sant’Ana de importância vital para o entendimento da história do município de Ouro Preto, famoso pelo seu patrimônio cultural.

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