Animais abandonados causam transtorno e insegurança à população da região

Itabirito,
29 de Julho de 2016

A falta de políticas públicas e de fiscalização constante encorajam o abandono dos animais de estimação

A milenar frase “o cão é o melhor amigo do homem” é uma citação que demonstra a relação de afeto entre o animal e o indivíduo. Mas será que o homem tem sido o melhor amigo do cão? O questionamento se torna válido ao observar o número de animais abandonados nas ruas, destacando-se os cachorros. O problema não causa prejuízo só ao município, mas também à população, pois além de ser uma perturbação social é uma questão de saúde pública. Outro ponto a ser considerado é que muitos deles estão sem vacinação ou qualquer outro tipo de controle populacional de animais de rua. A reportagem do jornal O LIBERAL recebeu diversas denúncias de animais abandonados. “Cães perambulando pelas ruas se tornou um problema frequente. Quando vou trabalhar de manhã bem cedo encontro com alguns pelo caminho. Morro de medo de ser atacada por eles. Um já chegou a me enfrentar, a sorte que me defendi com a bolsa, que estava bem pesada”, conta a moradora do Morro Santana em Ouro Preto, Aparecida Pereira. A perturbação é um problema comum às três cidades da Região dos Inconfidentes. Em Mariana, Itabirito e Ouro Preto, as declarações são sempre as mesmas. “São muitos cachorros soltos pela cidade e a maioria é grande, parecem bem tratados. Eu fico com medo, pois sempre me deparo com grupo de cachorros bravos, assustando e impedindo a passagem de pessoas”, relata o marianense Paulo de Souza.

Diferente de alguns países, no Brasil não há leis efetivas para defender os animais, principalmente de maus-tratos. Enquanto a fiscalização é falha, cabe a pessoas como o professor Marcelo Silva, tentar minimizar o abandono com trabalhos voluntários e de exemplo. Desde 2010, o biólogo e consultor ambiental desenvolve um projeto sobre educação de proteção animal nas escolas de Itabirito. O objetivo é conscientizar as pessoas de que o animal é um ser vivo que precisa de cuidados e carinho. “A proposta começou como uma atividade extracurricular onde um grupo de alunos, denominado ‘bioprotetores’, receberam capacitação sobre a vida dos animais, assim como a guarda responsável”, explica o biólogo. A iniciativa tomou grande proporção a partir de um trabalho em conjunto com a ONG Vidanimal, da qual Marcelo também participa. “Devido ao grande número de animais abandonados, a ONG não tem como custear todos os gastos, então sempre precisamos de ajuda. Assim, mobilizei os alunos e conseguimos arrecadar muita ração para alimentar os bichinhos. O trabalho foi um sucesso. Tanto, que até mesmo os alunos adotaram cachorros. O nosso objetivo é formar multiplicadores e construir uma rede de pessoas conscientes”, destaca o voluntário.

Outra proposta do programa é fazer com que os alunos levem em suas mochilas saquinhos com um pouco de ração. Quando um cão de rua é encontrado, o ‘bioprotetor’ o alimenta e tira uma foto como forma de divulgar o projeto.

Futuramente Marcelo quer expandir a iniciativa para toda cidade. “O problema do abandono em Itabirito é imenso. Eu pretendo abrir um curso de até dois encontros com estratégias didáticas para sensibilizar as pessoas de que o animal é um ser vivo que deve ser cuidado com responsabilidade”, expressa.

Políticas públicas e fiscalização

De acordo com a Constituição Federal, é dever comum da União, Estados e municípios preservar a fauna e a flora. Logo, os mesmos são responsáveis pelo controle populacional de cães e gatos. Os municípios tentam amenizar o problema com políticas públicas, mas falta investimento em campanhas de castração e fiscalização para evitar o abandono e maus tratos com medidas preventivas.

Os três municípios possuem um serviço para recolhimento de animais de médio e grande porte, mas a população se diz insegura, e afirma que falta supervisionamento. “A situação está cada vez mais perigosa e incontrolável, principalmente na parte alta da Bauxita, Há tempos ouvimos reclamações de cães soltos pelas ruas. Eu já cheguei a ser atacado por um ‘bitelo’ que veio de longe no meio da escuridão. A sorte que eu gritei e o bicho saiu correndo desorientado”, conta o morador de Ouro Preto, João Pedrosa.

Os animais que perambulam pelas ruas e consequentemente atacam as pessoas podem render problema na justiça para seus donos. Há tipificações no Código Penal e na Lei das Contravenções Penais, sendo considerada omissão de cautela na guarda de animais. Se o animal causar algum tipo de lesão, o dono pode ficar detido de dois meses a um ano. Nesse caso a vítima precisa registrar uma queixa na delegacia, onde será requisitado um exame de corpo de delito, que vai instruir o procedimento criminal. A ouro-pretana Lucília Oliveira relata que sua tia já foi mordida por um cão solto na rua. “O cenário é muito grave. Todos os dias nos deparamos com esse tipo de reclamação. Minha tia foi mordida a pouco tempo na perna por um cachorro, o problema que nem sabemos de quem era o animal”, conta a funcionária pública. “Deveria haver um controle dos animais domésticos com licença e que os animais que estão na rua deveriam ser recolhidos pela ‘carrocinha’, que aparentemente não funciona mais. Os animais soltos na rua são um risco de saúde e potenciais vetores de doenças. Se os animais tivessem licença, os donos seriam identificados e punidos pelo abandono e pelas perdas materiais de outros”, sugere Thiago Cerqueira Mattos, também morador de Ouro Preto.

Em Mariana, diferente de Itabirito e Ouro Preto, onde a captura é feita após denúncia, a prefeitura informou que o recolhimento e apreensão dos animais são feitos através de rondas diárias em logradouros do município por um veículo apropriado. Já os cães recolhidos após o rompimento da barragem estão sob os cuidados de uma empresa contratada pela Samarco. Os animais de grande e pequeno porte se encontram no Galpão de acolhimento localizado na rodovia do Contorno, próximo a Porteira de Minas.

O abandono e suas consequências

Nas três cidades, os casos de abandono são cada vez mais frequentes e com tantos bichinhos vivendo nas ruas, até o trabalho das ONGs de proteção fica mais difícil. Podem ser vários os motivos pelos quais as pessoas desistem dos seus animais, por isso antes de adotar é necessário que se conheça suas reais necessidades. “É preciso levar em consideração todos os cuidados que um animal de estimação requer, como o espaço, a renda familiar, a disponibilidade de tempo para os devidos cuidados que um animal necessita, pois além das necessidades físicas como alimento, alimento, água e cuidados médicos, também são essenciais os cuidados psicológicos, como por exemplo levá-lo para passear”, pontua o biólogo Marcelo.

Um animal abandonado está exposto a todo tipo de perigo: agressão, morte por envenenamento, atropelamento, o que também pode se tornar outro problema para a sociedade, pois podem causar acidentes de trânsito. A alimentação inadequada deixa o animal debilitado, o que compromete o seu organismo e o deixa suscetível a contrair várias doenças, podendo vir a transmiti-las ao homem.

Voluntários

Entidades de proteção aos animais e os órgãos governamentais têm procurado solucionar o problema, mas pela falta de informação, uma parte da população não se dá conta da crueldade e dos riscos de se abandonar um animal nas ruas. Na região, as ONGs tentam minimizar o problema com diversas ações de conscientização e também de controle populacional desses animais.

Em Ouro Preto a Associação Ouropretana de Proteção Animal (AOPA) há oito anos um trabalho de sensibilização junto à população e às autoridades no sentido de assegurar o bem estar-animal, promovendo a adoção responsável, castração como meio de prevenção contra a superpopulação de animais domésticos evitando posterior abandono, além de lutar por mudanças nas leis para punir quem maltrata, acumula ou os desampara à própria sorte.

Trabalham em parceria com o CCZ em ações de esterilização dos animais doados e carentes. “Muitas pessoas consideram que deveria ser criado um abrigo para colher os animais, o que seria um erro, já que seria apenas um paliativo para uma situação que acabaria servindo de estímulo para novos abandonos. Não podemos tirar essa responsabilidade dos órgãos públicos, é dever deles manter e elevar a saúde da população humana e a animal, para que possamos conviver harmoniosamente em uma sociedade”, destaca a presidente da AOPA, Luana Neves.

A ONG Vidanimal de Itabirito também trabalha em parceria com o executivo desde 2007 com o objetivo de controlar a população de cães e gatos no município. “O Projeto de Castração é realizado em parceria com a secretaria de Saúde de Itabirito e já foram castrados mais de três mil animais. Com o último convênio firmado no ano de 2015, a meta é alcançar quatro mil animais até o final deste ano”, destaca a advogada da ONG, Paula Gurgel.

Resgate e denúncia

Em Ouro Preto, para solicitar o resgate, visita, ou até mesmo adotar algum animal, a pessoa deve ligar para o Centro de Controle de Zoonose (CCZ) no 3551-3891. Já para recolhimento de animais de pequeno porte, que já estão mortos, o número é 3551-7512. Caso o proprietário do animal não possa cuidar dele, a Secretaria de Saúde pede para que a pessoa entre em contato para que seja feita uma troca de posse, evitando o abandono. Em Itabirito o número é o 3561-4033, e em Mariana o 3557- 2300.

Em ambos os casos, os animais recolhidos são avaliados pelo veterinário e após a triagem e procedimentos necessários ficam aguardando de 10 a 15 dias a retirada pelo dono. Caso não ocorra a retirada, eles são encaminhados para adoção. Para o acolhimento é necessário que o adotante apresente comprovante de endereço, documento de identificação e assine o termo de responsabilidade de posse responsável pelo animal.

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