Carta aberta à comunidade - Despedida definitiva

Itabirito, Mariana e Ouro Preto,
27 de Abril de 2015

No dia 21 de abril de 1955, então com 15 anos de idade, ingressei como musicista, na Sociedade Musical União Social, ao participar de apresentação na inauguração de pequena usina hidrelétrica, montada na cascata, propriedade do antigo Colégio Dom Bosco. Dez dias depois, 1º de maio, fiz minha primeira excursão com a banda, para se apresentar na cidade de Ouro Branco. Completam-se, portanto, depois de amanhã (21/04) 60 anos da minha integração à banda. Dois dias antes daquela data, para mim tão significativa, desligo-me da instituição à qual dediquei muitas horas de preocupação e esforços, para que ela continuasse a trilhar o caminho do sucesso. Aos que, apressadamente, podem julgar o gesto como revolta pela derrota do meu nome na eleição do dia 12 último, esclareço que eleição é assim mesmo; há que aceitar seu resultado. O discutível é a forma como, muitas vezes, se chega a determinado resultado. E o resultado, na recente eleição, escolha da diretoria para o biênio 2015/2017, foi obtido de forma insidiosa, pérfida, traiçoeira. Aqui apresento prova irrefutável do que digo. Observem que o referido cartaz pede Assembleia Geral para “tirar este monstro da banda”.

Mas vamos, primeiramente, a breve histórico da minha trajetória na “União Social”. Faço isso em respeito aos mais jovens, recém-ingressos, que merecem saber o que acontece. Comecei, portanto, com 15 anos, um pouco mais velho que alguns de vocês. Em pouco tempo tornei-me respeitado por todos os companheiros das fileiras e pelos diretores, especialmente o presidente Theodolino de Lemos e o tesoureiro José de Brito; isso em resposta à minha lealdade e dedicação à banda, bem como ao respeito que tinha por todos. Da banda obtive apoio moral na minha difícil adolescência e nos meus estudos no antigo Colégio Dom Bosco, onde passara a estudar, gratuitamente, graças à recomendação do Pe. Luiz Zver, diretor do então Oratório Festivo Dom Bosco, que eu frequentava. Quatro anos mais tarde, em 1959, também graças à influência desta banda, transferi-me para Ouro Preto, onde fui fazer meus estudos secundários, ingressando, ao mesmo tempo, na S.M. Senhor Bom Jesus de Matosinhos, que passou a ser a minha primeira banda, conservando, porém, a “União Social” como segunda. Em Ouro Preto, iniciei minha vida como trabalhador, casei-me em 1965, ocasião em que me desliguei da S.M. Senhor Bom Jesus de Matosinhos, continuando, porém integrado à “União Social”, a essa altura já um tanto debilitada devido a baixas nas fileiras e descontinuidade na formação de novos instrumentistas. Em abril de 1977, eu ainda residente em Ouro Preto, a banda não pôde tocar na Semana Santa; estava paralisada, sem qualquer atividade, como ensaios ou simples reuniões, havia seis meses, desde a festa da Padroeira, no ano anterior. Foi momento oportuno para sacudir a comunidade. Com o apoio decisivo do maestro Pedro Xisto Guilherme, que sempre nos auxiliava, mobilizei os oito ou dez companheiros restantes, em Cachoeira, convidei companheiros de bandas da região que, igualmente, nos davam cobertura e realizamos Assembleia Geral para reconstituir a diretoria, que não mais havia. Tal Assembleia e posse dos novos diretores se deu no dia 17 de abril de 1977, e, é por isso que cada mandato se inicia e termina no dia 17 de abril de ano ímpar. Reeleito a cada período de dois anos, exerci a presidência por dezoito anos, até 17 de abril de 1995, quando me afastei de qualquer cargo diretor, continuando, porém, a auxiliar a diretoria.

Somente concorri à presidência, novamente, em abril/2013, mandato ora encerrado, para quebrar impasse causado por nenhuma candidatura ter se apresentado àquela Assembleia Geral.

Agora esclareço os motivos que me levaram a me candidatar, findos os 18 anos de descanso, que se seguiram aos 18 anos como presidente.

Grupo de jovens instrumentistas passou a participar do intercâmbio informal, existente havia mais de 60 anos, com a Corporação Musical União Itabiritense. Tal intercâmbio consistia na participação de músicos de uma banda na outra, desde que sua banda de origem estivesse livre de compromissos no mesmo momento. Mas, o novo grupo, ferindo a ética e o conceito de lealdade, atropelando estatuto, regimento interno e autoridade dos diretores, passou a frequentar a segunda banda, deixando a primeira desfalcada em dias de ensaios e compromissos. Diálogo foi tentado, pelos diretores, por várias vezes, mas o grupo persistiu na indisciplina. Alguns compromissos a banda não pôde assumir devido ao comportamento desleal do grupo. Tentou-se obter do presidente da “União Itabiritense” a mesma atitude aqui adotada, ou seja, só convidar e aceitar a participação de outros músicos, quando sua banda de origem estivesse livre. O presidente rechaçou o pedido dos diretores da “União Social”, dando assim mais força à indisciplina nesta banda por parte do referido grupo.

Em abril de 2011, foi eleito presidente o Sr. Elmo José de Lemos, que passou a dar cobertura ao grupo até que, em 18 de setembro 2011, durante serviço contratado pela família de uma aniversariante, de 84 anos de idade, em Glaura, o grupo foi longe demais na indisciplina. Todo o grupo saiu das fileiras, abandonando a banda, em pleno serviço para se integrar à “União Itabiritense, que se apresentava em Amarantina”. Dias depois conclamei diretoria e toda a banda para que o problema fosse resolvido, sem pedir punição de ninguém. Entretanto, recebi comunicado, assinado por todos os diretores, de que, no caso em questão, não cabia exclusão, insinuando assim que eu teria pedido a expulsão do grupo. Havia patente interesse que eu me desligasse da banda, por isso a insinuação da exclusão, levando o grupo a se posicionar contra mim. Ao invés de me desligar, como queriam, candidatei-me, em 2013, a presidente com intenção declarada de solucionar o problema. Consegui eleger-me e, no primeiro compromisso logo ao início do mandato, o mesmo grupo abandonou a banda e foi tocar com a CMUI. Como o diálogo não surtira efeito até então, dei o ultimato: o grupo deveria respeitar as regras (estatuto, regimento interno e obediência aos diretores) ou se desligar da banda. Os rebeldes não aceitaram as regras, firmadas em documento por todos os demais integrantes. Em outubro daquele ano, 2013, todo o grupo se afastou da banda, sem qualquer informação à diretoria, conservando, porém, em seu poder uniformes e instrumentos. Campanha de difamação se iniciou contra mim, acusando-me de agredir verbalmente a todos na banda, tratar menores com desrespeito, incluindo-se palavrões, negar, grosseiramente e sem motivos, o empréstimo das instalações da instituição para evento beneficente, sem que tivesse sido procurado para isso; fui ainda acusado de humilhar menores em público. Inicialmente, chegaram a criar boato de que eu estaria, mentalmente insano, esclerosado ou teria tido um surto de loucura. As pressões foram tantas que me perguntaram se eu estava disposto a ir ao fim do mandato. Respondi que sim, pois não sou homem de fugir ao dever e aos compromissos assumidos.

Mediante notificação extrajudicial, a banda convocou os rebeldes e lhes deu a opção de reingresso, em janeiro deste ano. Entretanto, não quiseram e se desligaram, devolvendo todos os pertences. Desligaram-se da banda, porém deram sequência à campanha difamatória, que culminou na publicação mentirosa, em jornal de circulação irregular, meados de março último, no qual fui apontado como déspota, autoritário, ou seja, que administra mediante imposição de sua própria vontade. Observe-se que devido à circulação irregular, a resposta à matéria ainda não foi publicada na versão impressa, somente na versão online.

Se analisarem, imparcialmente, o que se fez, durante minha recente administração, foi apenas em cumprimento do estatuto, do regimento interno, além de respeito à ética e bom-senso, mas, mediante mentiras conseguiram desconstruir minha imagem formada ao longo de 60 anos. Aos políticos, para a próxima campanha eleitoral, sugiro que venham a Cachoeira do Campo, onde podem ser encontrados bons marqueteiros, especialistas em boatos maldosos. Difícil é identificá-los, pois se escondem sob a capa do anonimato covarde! A campanha saiu vitoriosa, pois gente que nunca aqui pisou para eleição de diretoria, desta vez, veio. Mas não veio para escolher diretoria, que podia ser qualquer uma desde que não contivesse meu nome. Quem compareceu tinha em mente tirar da banda o “déspota”, segundo o jornal que publicou a matéria e o “fingido, falso, mentiroso, muleque (sic), monstro e destruidor da banda” segundo o cartaz afixado na porta, dia 1º de fevereiro de 2015, que pedia Assembleia Geral para expulsá-lo. A campanha, iniciada em resposta à minha posição contra a indisciplina na banda, deu certo! O que pude realizar durante meu tempo na banda, não o fiz por vaidade ou por querer “mandar na banda”, conforme acusação recebida há poucos dias. Fiz porque considero dever do cidadão contribuir para preservar e melhorar a obra deixada por antecessores; fiz porque era meu dever retribuir o bem que me fizeram nesta casa; fiz porque, como ser humano sensível, não podia ficar, à parte, vendo a banda passar!

Especialmente a vocês, pequenos na idade e no tamanho, porém já se revelando grandes talentos, peço que deem o melhor de si para a instituição, mas não esperem agradecimentos. Se esperarem, poderão sair frustrados. Felizmente, nada fiz em troca de agradecimento, reconhecimento e honrarias!

Para o conhecimento de vocês listo algumas das realizações durante minha administração anterior. Foi dada organização à banda que, como instituição, passou a ter cadastro em todos os órgãos culturais; a partir de 1977, eleições regulares passaram a ser parte da vida da banda; durante nossa administração expandiu-se a sede com acréscimo do bloco a partir das duas vigas justapostas; a banda passou a realizar excursões por conta própria e a participar de eventos com outras congêneres; é de minha iniciativa pessoal a criação da bandeira da entidade, bem como o ritual de incorporação de instrumentistas, que vocês já conhecem. A “União Social” é a única banda a incorporar instrumentistas mediante ritual próprio e exclusivo. Graças aos meus contatos com os filhos de Joaquim de Lemos, saudoso companheiro das fileiras desta banda, obtive para a “União Social” o acervo musical deixado por ele; são cerca de duas mil partituras. Curioso é que já se tentou atribuir a iniciativa a outrem. O material foi transportado, gratuitamente, pela Transportadora Armênio Queiroz - TAQ, também graças às relações minhas com pessoal da empresa. Resumindo: a banda que estava praticamente liquidada ressurgiu, a partir dos poucos remanescentes, em abril de 1977. Por minha iniciativa e esforço pessoal, a “União Social” ganhou espaço na mídia, tendo suas atividades divulgadas por todos os meios ao nosso alcance. Tal iniciativa se coroou com a edição do livro, de minha autoria, do qual um exemplar ainda se encontra naquela vitrine. Mas a maior contribuição que nossa equipe deu à estrutura da “União Social” foi tornar permanente a escola de música. Sem o ensino e o ingresso de novos instrumentistas, a banda já teria deixado de existir.

Friso, mais uma vez, que o resultado da eleição não é o motivo da minha saída, mas, sim, a forma como se chegou a ele, por meio de mentiras, calúnias, sistematicamente repassadas, de boca em boca, ao longo de, mais ou menos, quatro anos. No dia anterior à colocação do cartaz, na porta da sede, ou seja, no dia 31 de janeiro último, alguém procurou-me em casa com recado bastante claro: pessoas o teriam procurado, para dizer que não me queriam à frente da “União Social”; que eu deveria desistir da candidatura porque estava fadado a ser derrotado. Por fim disse que eu deveria renunciar ao cargo. No dia seguinte, encontrei o cartaz afixado na porta, como espécie de ameaça. Portanto, desligo-me porque, conforme pediu o cartaz, quem compareceu à Assembleia Geral, não veio para escolher a diretoria, mas, sim “para tirar este monstro da banda”. Desligo-me também para não compactuar com a volta da indisciplina, facilmente presumida pela presença do grupo interessado, no domingo da eleição; para não compactuar com quem diz ser “discutível” a Portaria nº 21/2008, da Comarca de Ouro Preto, que proíbe bebida alcoólica em festas e reuniões com a presença de menores; para não compactuar com a volta da subserviência à Prefeitura Municipal de Ouro Preto, que loteou e se apoderou do mercado musical específico das bandas; para não compactuar com a mesma prefeitura, que submete as bandas a contratos leoninos, no pagamento por serviços prestados a terceiros (festas religiosas); Observe-se que da administração do Sr. Elmo, que voltou a submeter à banda a tal de tipo de contrato, cinco contratos a prefeitura deixou de pagar. Posteriormente, um deles foi pago pelo Dr. Dimas. Desligo-me para não compactuar com qualquer dependência desnecessária da banda, repudiando ainda a subserviência, seja ela a quem ou ao que quer que seja; para não compactuar com previsível volta à partidarização política da banda; para não compactuar com a aceitação de quaisquer preconceitos e desrespeito aos musicistas, à banda em si e ao trabalho realizado por ela.

Este ano comporta duas datas muito especiais para mim: os 60 anos de integração à banda e os 50 anos de casamento. As duas datas reunidas numa, pretendia celebrar com a banda, de forma singela, é claro, mas até isso, que eu considerava um privilégio, me é negado pelas circunstâncias. Resta-me o consolo de ter tido nesta instituição os melhores amigos, com os quais muito aprendi. Reafirmo o já dito em outras ocasiões. Grande parte do que sou hoje como cidadão devo a duas instituições, não oficiais, cachoeirenses: a Sociedade Musical União Social e o Oratório Festivo Dom Bosco, em sua versão antiga.

Há quase cinco anos, novembro de 2010, na gestão do então presidente, Erlon André de Matos, eu e minha esposa fizemos um testamento público, nomeando a “União Social” nossa herdeira. Nosso patrimônio material é pequeno, mas os direitos autorais sobre obras publicadas (duas registradas na Biblioteca Nacional) e sobre o que está para publicar, poderiam render dividendos para a entidade, considerando que obras ganham valor com a morte do autor. Diante da rejeição sofrida, providenciaremos para que tal testamento seja revogado. Não é conveniente à instituição ser herdeira de um monstro, cujas obras só podem ser monstruosidades. Curioso é que alguém duvidou e pediu provas da existência do testamento, mas, anteriormente, havia dado vazão a mentiras ouvidas.

Deixo uma mensagem aos que têm por ocupação a criação de mentiras maldosas; aos que têm prazer em propagá-las; aos que distorcem palavras com a intenção de prejudicar quem as diz; aos que espalham boatos nitidamente prejudiciais ao próximo; aos que ouvem e os repassam, sem investigação sobre sua origem e veracidade; aos que propagam falsas acusações e ainda as confirmam como se testemunhas fossem; aos que caluniam, talvez por inveja do caluniado.

Quando dificuldades inexplicáveis convulsionarem sua vida ao ponto do desânimo, lembre-se daquela mentira que você criou com interesse de derrubar alguém; quando tudo em sua vida parecer sem sentido e a dúvida o assaltar, pode ser que, em intuitivos momentos de clareza, você se lembre do prazer que teve por colaborar na disseminação de mentiras; quando eventual moléstia o assaltar, consumindo-lhe o prazer da vida e recursos financeiros, lembre-se das vezes que colaborou para que o próximo fosse prejudicado, inocentemente; quando a tragédia o visitar, talvez se lembre do quanto fez sofrer com calúnias, falsas acusações, ou repasse de boatos com a intenção clara de destruir alguém. Lembre-se de que o bem e o mal voltam ao praticante, é claro que com mais destaque para o mal.

Como última contribuição, se a aceitarem (trata-se de contribuição do monstro e destruidor da banda), deixo um CD com todos os registros da secretaria, e outro com minuta de novo estatuto a ser debatida em Assembleia Geral. Podia ter sonegado tudo isso, retendo em meu computador sem que mais ninguém tivesse acesso, mas minha consciência está bem acima do que supõem autores das vãs tentativas de me desmoralizar.

Lanço olhar do meu interior ao mundo espiritual e agradeço àqueles com os quais convivi e aprendi, quando nesta casa foram, de todos, amigos e companheiros; agradeço aos verdadeiros amigos que aqui deixo (que cada um consulte seu interior e verifique se realmente é meu amigo) e peço que me desculpem por eventuais ofensas que, creiam, foram involuntárias.

Isento a instituição, não culpada por ações deletérias, individuais e restritas a uns poucos; perdoo aos que me fulminaram com a língua, lançando ao lixo 60 anos de dedicação, mas entrego a Deus a cobrança pelas injustiças que me fizeram.

Cachoeira do Campo/Ouro Preto, 19 de abril de 2015.

Nylton Gomes Batista

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