Inovar para preservar

02 de Fevereiro de 2012
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

Passado o sufoco causado pelas chuvas - ainda não o perigo - seria hora de repensar o destino da cidade de Ouro Preto com vistas à sua preservação, para futuro mais distante, em paralelo com a segurança e bem estar de seus habitantes. Digo “seria” porque, assim como em outras ocasiões e em qualquer parte deste país, paliativos são respostas dadas às necessidades, que gritam por solução definitiva. Digo “seria” porque o “repensar” que imagino não creio se encaixar no ora aceitável por parte da população mais influente e conservadora; posição que, paradoxalmente, entra em conflito com inovações, que julgo necessárias para a almejada preservação.

O que às vezes digo neste espaço pode desgostar pessoas, mas isso é o que menos interessa, porque não escrevo para agradar a quem quer que seja. Se o meu pensamento se afina com o de outros, tudo bem. Se não se afina, paciência. Também estou consciente que corro o risco de sofrer “linchamento moral” por dar “pitaco” em assunto que seria da alçada exclusiva de especialistas, mas se tanta gente de fora dá palpite em Ouro Preto, por que ouropretano não pode? Embora classificado como “da roça” por parte dos ditos “trezentões” sou ouropretano, porque Ouro Preto é todo o município e não somente o distrito sede municipal.

De certa forma, a cidade de Ouro Preto já não pertence aos que nela vivem e isso há que se reconhecer, abrindo mão de algumas prerrogativas, como morar, instalar-se, transitar livremente em qualquer parte da urbe. A fama que lhe deu vários títulos, coroados por fim com o de Patrimônio Cultural da Humanidade, cobra seu preço e há que pagá-lo, para que futuras gerações não amaldiçoem o orgulho e intransigência dos seus ancestrais. O desejo esboçado por alguns ouropretanos de ter a cidade fechada numa redoma, talvez, seja mesmo necessário concretizar, não para deixar de fora os “de fora”, porém os próprios nativos, pois não há como combinar a vida moderna, dinâmica e bem estar da população com segurança em que entram todo o frágil acervo da cidade, assentado em solo instável.

De forma espontânea, vê-se nos últimos anos o esvaziamento das ruas mais centrais como área residencial, ficando ali tão somente o comércio leve, pequenas lojas, uma vez que supermercados também se afastaram do centro. O próximo seria a transferência das agências bancárias para outro local e o fechamento do centro histórico ao tráfego de veículos automores, exceção a se fazer ao serviço de entregas em horários predeterminados. O centro histórico deveria se voltar exclusivamente às atividades do turismo que, quer queiram ou não, é o destino lógico para a cidade de Ouro Preto. Ao mesmo tempo, faz-se necessário o reassentamento de famílias ocupantes de áreas das mais perigosas nas encostas, estímulo à mudança de outras de áreas com menor risco e reserva, assim como áreas de preservação ambiental, de pontos onde se tornaria proibido construir.

A perdurar o quadro atual de riscos, que teve início com abertura da rodovia (anos cinquenta) cujo trecho urbano é a Rua Padre Rolim, todas as construções na região da montanha terão seu risco aumentado a cada ano, por ocasião do período chuvoso. O primeiro grande deslizamento ocorreu em 1960 (nas mesmas proporções do último, dia 3 de janeiro) e outros menores, porém igualmente desastrosos se seguiram. Portanto, a culpa original pela série de deslizamentos na Rua Padre Rolim é do governo do Estado, responsável pela implantação da rodovia e consequente acesso que, na opinião deste leigo, nunca deveria ser naquela região. Em segundo lugar vêm as autoridades e políticos locais, que fizeram vistas grossas ou estimularam a ocupação e, por fim, vem a imprudência humana.

No momento, para que a cidade se transforme sem perder suas características, há que alargar os horizontes, desviar um olho do próprio umbigo e dirigir o olhar para além dos limites urbanos, alcançando os 1.245 quilômetros quadrados do município de Ouro Preto. Política de desenvolvimento integrado deveria contemplar todo o município, lembrando que cada distrito, afora o distrito sede municipal, é unidade merecedora da mesma atenção e nenhum deles constitui apêndice da cidade, ou a ela pertence. Cada um é parte distinta da sede e a soma de todos é que faz o município. A observação vale para todo o Brasil, cujas administrações municipais supervalorizam os distritos sede (cidades) em detrimento dos demais distritos que, muitas vezes, amargam o abandono. No caso de Ouro Preto, atenção especial aos demais distritos, cuidando de ali estabelecer serviços públicos e estimular a fixação de suas populações, é caminho razoável para conter o inchaço da cidade, deixando-a mais segura para todos e mais livre para as atividades turísticas.

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