O fechamento da Novelis e as vocações de Ouro Preto

09 de Novembro de 2014
Jornal O Liberal

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Mauro Werkema

O fechamento da Novelis, antiga Alcan, de Ouro Preto, é uma morte já anunciada. A fábrica, assim como ocorre com outras produtoras de alumínio, como a Alcoa de Poços de Caldas, que também será paralisada, já não tinha condições de competitividade há alguns anos. No caso de Ouro Preto, as condições eram ainda mais desfavoráveis: alto custo da energia elétrica, uma vez que a produção de alumínio é eletrointensiva, a inexistência da bauxita, matéria-prima do alumínio, de boa qualidade e próxima; o alto custo do transporte, uma vez extinta a ferrovia e o fato de a unidade industrial ouro-pretana ser muito antiga, com tecnologia superada. Acrescenta-se a questão da localização, no interior de Minas, longe dos portos. A fábrica realizou investimentos na geração de energia, na usina do Salto e em parceria com outras indústrias. Mas não encontrou, por parte da Cemig, aceitação de uma tarifa adequada aos custos operacionais. A unidade de Ouro Preto, na totalidade de seus serviços, chegou a ter cerca de 2.500 funcionários e, durante muitos anos, foi a principal empregadora de toda a região, além de gerar receitas públicas importantes para o município. Com seu fechamento, encerra-se um ciclo econômico/industrial para a história contemporânea da cidade tricentenária.

Cerca de 300 funcionários perdem o emprego e persiste a discussão sobre o que fazer com as instalações da fábrica. Poderão estas instalações serem vendidas ou simplesmente transformadas ou destruídas? É bom sempre lembrar a história para refletir sobre a atualidade. A fábrica iniciou-se em 1936, por iniciativa do industrial Américo René Gianetti, gaúcho, formado na Escola de Minas, com o nome de Elquisa (Eletro-Química Brasileira S/A) inicialmente produzindo um tipo de cimento alumínico e, a partir de 1945, alumínio primário, chamada alumina. Sofreu boicote do truste internacional do alumínio, que alegava existir excessiva oferta no mercado internacional do pós-guerra. Gianetti, em várias ocasiões, firmou que a crise se deveu à Segunda Guerra Mundial mas também à falta de apoio de Getúlio Vargas.

Em 1952, a fábrica foi adquirida pela canadense Alcan. Em 2007, já Novelis, foi vendida ao grupo indiano Aditya Birla que, dois anos depois, anuncia a redução de sua produção por falta de preços competitivos no mercado e o custo elevado de produção da antiga fábrica de Ouro Preto. Além disto, era fator negativo a pouca capacidade da usina de Ouro Preto, cerca de 50 mil toneladas/ano, não permitindo a obtenção de uma nova escala de produção. Estatísticas do setor revelam que a produção brasileira caiu mais de 50% nos últimos anos e que o País deverá importar alumínio, a não ser que seja resolvida a questão, o que demandaria longo prazo, considerando o fator energia elétrica, que careceria de redução das tarifas ou altos investimentos em usinas próprias, além de modernização das instalações atuais.

A antiga Alcan foi muito importante na história ouro-pretana. Em 1952, a cidade encontrava-se em profunda estagnação. Na década de 40, segundo estudo de Sylvio Vasconcellos, então representante do IPHAN em Minas, a cidade perdera quase metade da sua população desde a mudança da capital para Belo Horizonte. Vários casarões antigos estavam abandonados, em situação precária. A Escola de Minas ainda falava em mudar-se para Belo Horizonte, conforme petição apresentada por alguns professores, em 1944, a Getúlio Vargas, que viera a Ouro Preto para inauguração do Museu da Inconfidência. A Alcan reanimou a economia regional, criou empregos para professores da Escola de Minas e engenheiros, gerou tributos para a Prefeitura. Mas, é preciso dizer, acabou provocando uma intensa e desordenada expansão urbana de Ouro Preto no entorno da fábrica, com os novos bairros da Bauxita e Saramenha, hoje já bastante edificados mas com inúmeros problemas de urbanização e oferta de serviços públicos.

Os críticos dizem que a Alcan/Novelis encerra suas atividades sem maiores contribuições mais perenes para Ouro Preto. Não criou uma escola, hospital ou unidade de saúde, não investiu em infra-estrutura urbanística, em saneamento básico. Realizou, é preciso reconhecer, alguns apoios a atividades culturais, a algumas iniciativas educacionais e de preservação do patrimônio arquitetônico. E, por décadas, poluiu o ar de toda a cidade. Mas é fato que, durante muitos anos, obteve altos lucros. Como a crise atinge todo o setor de alumínio e a fábrica de Ouro Preto apresenta questões de competitividade ainda mais desfavoráveis, o fechamento é irreversível. Resta saber o que pode ser feito, como já dissemos, com todos os seus acervos, não só os industriais, mas os imóveis e terrenos. E, como seria justo, se a Prefeitura irá receber algum patrimônio ou qualquer outro tipo de benefício compensatório.

Finalmente, é importante, senão extremamente oportuno, que seja feita a reflexão sobre o futuro de Ouro Preto. Há amplo consenso que a cidade tem suas vocações que, por sorte, são também geradoras de emprego e renda. E são atividades “ambientalmente limpas”: turismo e educação. Com a UFOP e o IFMG, instituições em expansão, a cidade é hoje um polo educacional já de grande porte. E também já com a reputação internacional de destino turístico, com o título de Patrimônio Cultural da Humanidade (Unesco/1980) precioso acervo cultural e artístico, rede hoteleira e boa oferta gastronômica. Estes dois setores são o futuro da cidade, mas é preciso que esta vocação seja plenamente exercida, com correção de várias questões que ainda se colocam negativamente ou que impedem o pleno usufruto de suas potencialidades econômicas e sociais. O fechamento da Novelis/Alcan, e todo o simbolismo que enseja, deveria provocar esta reflexão sobre o futuro de Ouro Preto, suas vocações, seus caminhos, suas dificuldades e como removê-las. E o tempo voa e o Brasil também precisa encontrar novos caminhos.

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