Por que o voto obrigatório é um crime de estado

26 de Outubro de 2014
Jornal O Liberal

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*Paulo Felipe Noronha

Ainda criança, na primeira ou segunda série do ensino primário, a professora ensejou uma discussão em sala de aula da qual até hoje me recordo. Ela questionou aos estudantes o que achávamos do voto obrigatório no Brasil. Como é típico dessas discussões onde todo mundo é meio mal informado (ou por inteiro) não se chegou a nenhuma conclusão, tudo gravitando em torno de duas teses: “o brasileiro não tem condições de decidir se quer ou não votar, pois é miserável e ignorante” contra “ninguém pode obrigar alguém a votar”. Ainda que tenha havido impasse, a primeira tese conseguiu maior simpatia, minha inclusive. Saímos daquela aula mais vulneráveis à servidão, ao cabresto, mas pelo menos tivemos oportunidade d’alguma reflexão.

Recentemente, o Brasil se tornou alvo de saudável chacota internacional, devido ao material de campanha veiculado no horário eleitoral gratuito chamando para candidatos que, aos moldes do precursor Éneas Carneiro, adicionam comicidade ao processo eleitoral, vide figuras como Bin-laden, Obama, Tiririca ou Paulo “o raio privatizador” Batista (o que é tudo perfeitamente compreensível, o processo político tem muito de humor e absurdo, especialmente por essas bandas) e que mirariam os chamados votos de protesto, dos indignados com a política. Discordo que o recurso humorístico sirva apenas para o voto de protesto, afinal, mesmo o candidato ideológico/propositivo tem se valido dele, já que fica difícil o destaque em meio a toda fisiologia e oportunismo geradas pelo próprio sistema atual.

A crítica internacional acertou 100% num ponto, entretanto: ao proclamar que “quando você obriga os outros a fazerem algo, eles ferram com a coisa”. Mas a culpa não é do cidadão. O voto obrigatório é uma imoralidade, um crime do estado contra seu povo, pois, realmente, ninguém tem o direito de obrigar outra pessoa a uma escolha que ela não quer tomar. As pessoas são livres para ir e vir, ou não ir. Um direito não pode ser imposto! E não há argumento no mundo que vença essa verdade. Não há atenuante, não há tom de cinza. Há apenas o autoritarismo da coisa toda, o estado tomando para si uma decisão que não lhe pertence, invadindo o espaço do indivíduo. E já passa da hora da população despertar e se posicionar contra o voto obrigatório com mais força.

E não somos minoria! Segundo pesquisa Datafolha, veiculada no jornal Folha de São Paulo no primeiro semestre de 2014, 61% da população brasileira já é contra o voto obrigatório. A vontade popular é clara: democracia! Assim como em diversos outros assuntos, o estado insiste em ignorar um entendimento claro da maioria do povo brasileiro, para manter o status quo. Paralelamente, avança agendas que em nada estão sintonizadas com os anseios verdadeiramente populares. O crime, então, se aprofunda.

Por fim, precisa de prova maior do desincentivo à escolha do quê a ausência de uma tecla “nulo” na urna eletrônica? Nos dão, formalmente, a opção de votar em branco, mas nos ocultam a opção do genuíno voto de protesto, perpetuando assim, o domínio autoritário da verdadeira elite opressora desse país: a classe política.

*professor e redator em O LIBERAL

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