A abusiva celebração da Inconfidência Mineira

20 de Abril de 2012
Jornal O Liberal

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Mauro Werkema

Repete-se, uma vez mais, aquilo que tem gerado protestos dos ouropretanos, da sua Câmara de Vereadores, das entidades comunitárias e até, de forma mais discreta, da própria Prefeitura: uma abusiva e desfiguradora ocupação da Praça Tiradentes por palanques feios, imensos, destinados a abrigar os convidados e medalhados para a cerimônia do dia 21 de abril, data em que, por lei estadual, desde 1952, por iniciativa do então governador Juscelino Kubistchek, se homenageia os conjurados mineiros de 1789. Ao invés de alegria e regozijo, a cidade sofre: imobilizada, invadida, costumeiramente sob repressão policial excessiva, acaba nem assistindo a própria solenidade, pois a praça ocupada e delimitada por cordas e correntes, pouco espaço deixa para o povo.

Do alto de seu pedestal, intencionalmente de costas para o Palácio dos Governadores, símbolo do poder, voltado para o prédio do antigo Senado da Câmara e Cadeia, mais próximo do povo, o alferez Joaquim José da Silva Xavier, contempla esta parafernália. Consagrado pela opinião popular, ao completar 220 anos de seu enforcamento, no Rio de Janeiro, a 21 de abril de 1792, seus detratores não conseguirem reduzir sua reputação. E isto porque esteve ao lado do povo, das causas populares, pela liberdade e autonomia de sua terra, contra a opressão e oficialismo colonial. Não há como deixar de enxergar, nesta cerimônia do dia 21, tal como concebida, certo paradoxo, senão contradição, entre o pensamento inconfidente, libertário e popular, que Tiradentes melhor simboliza, e o oficialismo burocrático e frio, voltado para si mesmo.

Várias tentativas já foram feitas para limitar esta cerimônia aos discursos oficiais, que cada vez mais se distanciam da ideologia da Inconfidência, e do exemplo dos seus mártires, e a realidade atual, sentido maior da celebração histórica. Chata, oficialesca, fechada, distribuidora de medalhas, às vezes até três centenas, a quem não merece e mesmo nada tem com Minas e o espírito inconfidente, a cerimônia ficou anacrônica, mais militar do que cívica, mais próxima da politicagem e da promoção pessoal do que da exaltação real dos que merecem ser lembrados e celebrados. Aliás, na lista da Medalha estão e estiveram supressores da liberdade, ditadores e torturadores, medalhados apenas por bajulação, sem qualquer currículo ligado a Minas ou serviço prestado à Nação.

Com isto, a cada ano, reduz-se a memória e o respeito à cerimônia, que já foi muito bonita, que emocionava aos mineiros, orgulhosos dos seus inconfidentes e do papel da Conjuração Mineira como sentimento nativista precursor da Independência do Brasil, ocorrida 30 anos após a execução de Tiradentes, cuja figura de homem e revolucionário foi modelo para a campanha republicana vitoriosa em 1889. Nação com poucos heróis, mas com muitos bandidos, infelizmente vamos perdendo a oportunidade de exaltar nossos homens e seus feitos históricos, mesmo os mais dignos e significativos, como a conspiração de poetas, padres e militares nesta Vila Rica, visionários de um Brasil independente e dono de suas grandes riquezas. O abastardamento da cerimônia do 21 de abril nos coloca, cada vez mais, longe desta possibilidade.

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