A vida na alimentação

05 de Agosto de 2011
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

Repercutiu na imprensa o resultado de pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE. De acordo com os resultados obtidos, o brasileiro se alimenta mal; não na quantidade, mas quanto aos valores nutricionais do que se come.

De certa forma já se sabia disso. A bom observador não escapa o desvio em que se meteram hábitos alimentares nacionais, com o início do processo de industrialização e o ingresso da mulher no mercado de trabalho. Aos mais afoitos (e afoitas) esclareço não se tratar de crítica ou barreira à participação da mulher em qualquer atividade e, muito menos, querer limitá-la aos afazeres domésticos. A saída da mulher para o trabalho fora de casa é apenas um dos fatores que contribuíram para a quebra da qualidade nos hábitos alimentares brasileiros, mas, pode-se dizer que foi o puxador de fila. Nas grandes cidades, onde vícios alimentares são mais evidentes, a manutenção da família tornada pesada para uma só pessoa, conjugada com a explosão industrial, levou as mulheres para as fábricas. Em seus lugares ficavam, às vezes, meninas na pré-adolescência, a cuidar dos afazeres domésticos, entre os quais, o preparo da alimentação para os irmãos pequenos. Sem o requerido tempo para o aprendizado no preparo de alimentos junto à mãe, essas meninas ficaram limitadas ao preparo do mínimo suficiente para não se morrer de fome. E elas tiveram efeito multiplicador, no momento de seu ingresso no mercado de trabalho, deixando em casa a irmã imediatamente mais moça como responsável pela cozinha.

Em seguida, vieram produtos e mais produtos industrializados, uns para facilitar e apressar a colocação da comida na mesa e, outros, para desviar a infância dela (da mesa). Na mesa se colocaram inúmeros itens industrializados, com destaque para carnes e massas, enquanto, a criançada passava a fazer a festa com o consumo de antialimentos, muito bem definidos como “porcarias” por críticos desse tipo de produto, com o qual supermercados passaram a ganhar rios de dinheiro. A essa altura, casas e mais casas de comida rápida (fast food para os norte-americanos) se instalaram em pontos estratégicos, completando-se o processo de subversão dos hábitos alimentares, iniciado com a alegada falta de tempo, em casa, para o preparo da alimentação.

A tendência nacional para macaquear, sempre o pior de culturas estranhas, deu sua contribuição. Quando deveria ser copiada dos setentriões o gosto pela organização, pela aplicação da lei, pela punibilidade, pelo empreendedorismo em larga escala e burocratizado ao mínimo, copia-se o mau gosto em tudo, incluindo-se hábitos alimentares já denunciados entre eles próprios como sério problema de saúde pública. A alimentação é também questão de educação; educação do paladar de acordo com as necessidades nutricionais, que deve se iniciar na transição entre o aleitamento e a ingestão de alimento sólido. Cabe aos pais essa orientação, dando bom exemplo na opção por alimento bem dosado em calorias, vegetais frescos (verduras, legumes e frutas), evitando antes a saturação do paladar com guloseimas em excesso e fora de hora. Infelizmente, comodismo e a funesta política do laissez-faire, segundo a qual a educação infantil deve ser mais solta, sem interferências e obrigações interpostas por adultos, muito têm colaborado para agravar a questão da alimentação, tão desequilibrada entre os que não padecem da fome.

Não somente o dito até agora pode ser apontado como causa do desvio alimentar, estando de permeio até preconceitos como o relacionado com o ato de cozinhar, considerado demeritório por muitos, o que por si só revela falta de visão mais ampla sobre a vida. Ao contrário, o ato de cozinhar está entre as mais nobres atividades humanas, pois se relaciona com a alimentação, indispensável à manutenção do organismo em perfeitas condições de garantir a energia vital. É, portanto, atividade que deveria ser considerada a principal, bem valorizada e salva de preconceitos, tanto por parte de mulheres, que a veem como função menor, quanto da parte de homens que a têm como trabalho exclusivamente feminino.

O apetite é o alerta quanto à necessidade de ingestão de alimento, e, o prazer auferido pelo paladar é apenas o meio mediante o qual a natureza compensa nosso atendimento àquela necessidade. Mas, antes há também que estar atento à correspondência entre os valores nutricionais do que se come e as reais necessidades do organismo.

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