Batalhas, sedições e conspirações – parte I

17 de Fevereiro de 2014
Alex Bohrer

Alex Bohrer

O século XVIII foi, sem dúvida, o século áureo de Ouro Preto, a fase epopéica de sua formação e consolidação: vem desta centúria a maior parte das riquezas culturais, arquitetônicas e artísticas que projetariam a antiga Vila Rica para o mundo. Mas é correto dizer que o mesmo século XVIII foi também o mais violento e conturbado da história desta cidade. Marcam o setecentos (não só o setecentos vilarriquenho, mas o setecentos mineiro) três especiais momentos que, por causa mesmo da turbulência, constituem instantes privilegiados de ruptura. São eles: a Guerra dos Emboabas, a Sedição de Filipe dos Santos (também chamada de Revolta de Vila Rica ou Revolta de 1720) e a Inconfidência Mineira (por vezes chamada de Conjuração Mineira). Analisemos sucintamente cada uma.

Alegadamente os bandeirantes paulistas foram os descobridores das primeiras minas de ouro. Natural que as notícias sobre a riqueza repentina advinda da exploração do mineral espalharam-se pelo Brasil e Portugal. Levas de imigrantes principiaram a chegar não só de São Paulo, guiados pelos antigos caminhos bandeirantes, mas de toda a colônia e reino. Os forasteiros, especialmente os portugueses, não eram vistos com bons olhos pelos paulistas. Estes, como descobridores das minas, julgavam-se usurpados do seu direito de exploração (que queriam fosse exclusivo).

O imaginário nacional idealizou a figura dos bandeirantes paulistas como intrépidos homens, bem vestidos, protegidos e armados. Mas isto não passa de idealização. Andavam nossos bandeirantes em geral descalços, com uma espécie de bermuda. Muitas vezes descamisados. Entre as armas, o arco e flecha indígena. A língua era uma mistura de tupi com português. E foram estas diferenças, irredutíveis em si, que deram origem aos atritos. Os paulistas começaram a chamar os portugueses de emboabas, palavra indígena que significa “pinto calçudo”, uma alusão ao fato, estranho aos paulistas, dos portugueses usarem calças e botas!

Os primeiros atritos tiveram origem no Caeté, envolvendo o poderoso português Manuel Nunes Viana, que logo viria a se tornar o líder emboaba. Tanto paulistas, quanto emboabas, reivindicavam o direito de exploração. Não tardou muito e o conflito deu origem às escaramuças armadas que a historiografia consagrou como Guerra dos Emboabas. Corria o ano de 1708.

Do Caeté, cada vez mais acuados, os paulistas vieram se refugiar no Arraial de Cachoeira do Campo (município de Ouro Preto). Em Cachoeira prepararam-se para a grande batalha, fortificaram o arraial, cavaram trincheiras (que ainda podem ser vistas em algumas partes). Vindos pelo vale do Amarante (hoje distrito de Amarantina), seguindo o Rio Maracujá, os portugueses enfrentaram os paulistas numa batalha encarniçada, batizada por Diogo de Vasconcelos como Batalha da Cachoeira. Três dias depois os Emboabas expulsaram os paulistas do arraial. Os atritos entre paulistas e forasteiros marcam decisivamente o período inicial de exploração aurífera, assinalam essencialmente uma época em que o aparelho governamental português ainda não se fazia sentir nas Minas recém descobertas. Ouro Preto nesta época era um amontoado de arraiais, compostos por choupanas pobres, sem nenhuma infraestrutura urbana.

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