Cadê Honduras?

10 de Outubro de 2011
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

Há dois anos, os olhos do mundo estavam voltados para Honduras, pequeno país de sete milhões e meio de habitantes, localizado na América Central. Em outras circunstâncias, os hondurenhos estariam a levar suas vidas, longe dos holofotes da mídia e das considerações prepotentes de governos do dito primeiro mundo, mas informação de que seu presidente fora preso, de pijama, antes de o sol nascer, por um general do exército, alterou o status hondurenho ante os olhos dos donos da política mundial.

Prisão de presidente da república, no exercício do cargo, em plena madrugada, de pijama e, ainda por cima, por um general do exército, não pode ser outra coisa senão quartelada ou golpe militar. Assim se espalhou a notícia e assim se estabeleceu o bafafá. Coitadinho do presidente, democraticamente eleito, fora arrancado do seu leito e expulso do país por brutamontes fardado, armado!

Parecer, parecia, mas golpe militar não era. Alguém já viu golpe militar em que os militares ficam fora do novo governo? Se, em Honduras, houve, foi a primeira vez, porque quem assumiu a presidência foi o presidente do Congresso Nacional, de acordo com o que determina a Constituição daquele país E continuou a parecer porque os grandes, dentro da política internacional, não conheciam a situação política, vivida por Honduras naqueles últimos meses e, tampouco, a tinham analisado à luz da sua Constituição. A prepotência dos grandes não lhes permite aceitar que pequeno país, do dito terceiro, quarto ou último mundo, se conduza por constituição capaz de impedir sonhos continuístas, meio pelo qual déspotas podem nascer.

A Constituição de Honduras não permite a reeleição do presidente, tem como obrigatoriedade a alternância no poder e trata violação dessa regra como traição à pátria. Mais à frente, o mesmo documento enumera cinco situações em que se perde a cidadania; e um delas diz: “Por incitar, promover ou apoiar o continuísmo ou a reeleição do Presidente da República”. Por esse dispositivo, percebe-se que, teoricamente, Zelaya deixou de ser presidente no momento em que quis realizar referendo popular para tentar alterar a Constituição no tocante à reeleição do presidente da República. De acordo com a Constituição, ele já havia perdido a cidadania hondurenha, primeira condição para ser presidente da República. Sua prisão não fora iniciativa militar, porém, determinada pelo Ministério Público, em cumprimento da mesma Constituição. O único ato consumado, e não previsto em lei, foi sua expulsão do território hondurenho, explicado, posteriormente, ter sido feita para sua própria segurança.

A partir daí a corrente pró volta do Zelaya ao poder se criou, Brasil à frente, no esquema de repatriação do mesmo, incluindo-se abrigo na embaixada brasileira. E foi aquela patuscada do governo tupiniquim que, na escala da política internacional, acabara de trepar num tijolo e fazia o que condenava na postura de outros governos: interferência em assuntos internos de outrem. Os governos, mundo afora, mesmo depois de perceber o equívoco, no julgamento do caso Honduras, não deram o braço a torcer. E a opinião pública foi manipulada e induzida a ver o caso como golpe, porque falta, aos grandes, humildade bastante para reconhecer seu próprio erro, considerando Honduras como país incapaz de se governar dentro dos princípios democráticos. Tudo se fez, de fora, para que Zelaya fosse reconduzido, incluindo-se exigência da ONU e ultimato da OEA, que ameaçou Honduras com expulsão daquele organismo, se o poder não fosse restituído a Zelaya, em prazo de setenta e duas horas.

Escorada em sólidas instituições, como o Legislativo e o Judiciário, Honduras resistiu bravamente, não se submetendo às imposições externas. Eleições já previstas no calendário eleitoral foram realizadas e a sucessão se processou normalmente com a posse do eleito que, diga-se de passagem, era da oposição.

Passados dois anos depois daquela turbulência, Honduras voltou ao esquecimento na mídia internacional e, mesmo na internet, notícias sobre aquele país ainda são, praticamente, as mesmas em torno do “golpe de estado” ou “golpe militar”. Assim como nunca se viu golpe militar em que militares ficam fora do governo, também nunca se viu eleição, agendada de acordo com o calendário eleitoral, se realizar logo após de golpe militar. Nem esses detalhes foram lembrados pelos que se encarregaram espalhar a mentira do “golpe”. Nenhuma nota, nos grandes jornais, apontou os dispositivos constitucionais nos quais se basearam as demais autoridades constituídas para afastar Manuel Zelaya da presidência da República.

No cenário internacional Honduras foi recolhida à sua insignificância, em contraste com sua grandeza interna, assentada na solidez de suas instituições e altivez diante do ladrar dos cães, forçados, em seguida, a sair com o rabo entre as patas!

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