Ao ouvir a bronca do Tatão, relativa ao falso conceito de investimento empregado como propaganda pelo governo, Manelão não se contém:
– Quer dizer que, além de pagar mal aos aposentados, os energúmenos ainda fazem gracinha à sua custa? Classificar como investimento a execução da folha de pagamento é o fim da picada! E ninguém denunciou isso?
– Pelo visto, não – responde Tatão, acrescentando – somente agora tomo conhecimento do assunto. De acordo com o cabeçalho do texto, a matéria foi veiculada no site da própria Previdência Social.
– Isso mesmo! – confirma Dolores – foi copiado por minha filha.
– Gente! Pode ter sido equívoco de quem redigiu – levanta-se Dorinha em posição de defesa.
– Lá vem você a defender a pilantragem oficial – reage Manelão, seguido de Tatão que explica:
– Não se trata de mero equívoco. Em rápida “corrida d’olhos” pelo texto, constato que o termo é empregado, sistematicamente, diversas vezes.
E Dolores acrescenta:
– Para ser mais precisa, o termo é utilizado três vezes e, de acordo com a minha filha, todo o texto tem quinhentos e quarenta e duas palavras. Diz ainda minha filha que, em texto desse volume, se determinada palavra aparece por três ou quatro vezes, significa que está sendo empregada como “palavra chave”.
– E o que é “palavra chave”? – indaga Chiquinha
– É ponto de partida para pesquisa na internet.
– Ainda não entendi bem – adianta-se Lazinha.
– É palavra que, digitada nos sites de busca, aponta textos que tratam do assunto por ela sugerido – é a Dolores novamente, que continua – no caso em questão, a palavra “investimento” pode apontar a página de que falamos agora, entre muitas outras dentro do mesmo assunto.
– É a mais velhaca deturpação de conceito – diz Tatão – para atender conveniência do governo no que diz respeito a propaganda falaciosa, incluindo-se informação de que o aludido montante é transferido para a economia dos municípios.
– Nesse aspecto – diz Dorinha – não vejo nada falso, se considerado o aposentado como munícipe. No fundo, no fundo, o dinheiro entra no município.
– Você diz muito bem: entra no município. Entretanto, nem sempre ele aí circula. Há municípios tão pobres, que não têm onde o cidadão prover suas necessidades. Ele acaba por se deslocar para outro município, onde então gasta seu dinheiro. E como exemplo disso nem é preciso buscar município tão pobre assim, pois o fenômeno acontece aqui mesmo.
– E é a pura verdade! – atravessa Chiquinha – é só conferir o fluxo de usuários de coletivos na região.
Nos primeiros dias de cada mês todos correm ao distrito-sede municipal e, ali engrossam filas nas agências bancárias, para receber seus caraminguás oriundos do INSS. Em seguida descem à cidade vizinha para fazer compras, muitas vezes, na ilusão de que estão a levar vantagem. Aqui, não é por pobreza do comércio, mas para fugir de preços altos ou mesmo por modismo; para dizer que compraram lá fora. É a repetição do que acontece no topo da escala. Não raras vezes, em sua ânsia exibicionista, brasileiro traz do exterior e só aqui constata na etiqueta do produto: “made in Brazil”... coisas da cultura tupiniquim!
Tatão continua:
– O governo deturpa conceitos quando denomina investimento a execução de folha de pagamento da Previdência e confunde as pessoas ao dizer que tais recursos foram repassados à economia dos municípios. Só se diz que recurso financeiro da administração federal é repassado aos municípios quando contabilizado pelos cofres municipais, ou aplicado em realizações dentro do próprio município. O resto é “conversa mole pra boi dormir”, é tentativa de enganar os cidadãos.
– E o pior é que consegue – afirma Narita, secundada por Dolores:
– Nada faz mais falta ao povo do que a educação, em seu sentido mais amplo. Povo educado não cai nessas patacoadas!