Coisas de ontem... e de hoje CXVIII

19 de Setembro de 2014
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

Com o texto a circular de mão em mão, o grupo de aposentados prossegue na troca de impressões sobre o conteúdo da informação procedente do INSS. Dorinha, a princípio em posição de defesa daquele órgão com relação ao termo “investimento” empregado no texto, retrocede:

– Devo confessar, gente, não ter percebido a impropriedade do termo na informação em questão. Diante da exposição feita pelo Tatão pude, então, compreender o sentido da crítica que se faz.

– Mas, você não é a única que não percebeu; tive minha atenção chamada pelo que disse a Dolores ao apresentar o texto. Se não fosse isso, talvez tivesse lido a matéria sem notar a falsidade nela contida.

– Também eu não teria notado, não fosse minha filha – esclarece Dolores, continuando – que esmiúça textos e enxerga coisas que eu só percebo ao me dissecar o conteúdo lido.

– Creio que nenhum de nós teria atinado com a coisa – comenta Mário, continuando – na maioria das vezes, a leitura é feita sem o espírito crítico, indispensável quando a informação tende à polêmica.

E Tatão complementa:

– Na verdade, os poucos que leem são apenas devoradores de palavras. Entre esses, há um grupo reduzido, que consegue interpretar o sentido do escrito, em seu aspecto mais imediato, mas raros são os que conseguem alcançar a verdadeira intenção do autor do texto. Aos que buscam o controle e o domínio das massas interessam os devoradores de palavras. Distribuídas estrategicamente, as que lhes convêm são capazes de seduzir os menos atentos à leitura. Outras vezes, nem há preocupação com a estratégia, pois são colocadas de forma escrachada, para enganar de um lado e lucrar de outro. Há jornais menos sérios, sensacionalistas, que se valem disso para vender e também arrumar confusão.

Aqui Manelão intervém:

– Chiii! Lembrei-me do caso do cachorro...

– Que cachorro, Mané? – indaga Chiquinha, seguida do Tatão, que se mostra curioso ante o jeito molecão do amigo:

– Será o mesmo em que penso?

Logo em seguida, como se a ler grande manchete em jornal, Tatão fala em voz alta: “Cachorro faz mal a menina de dez anos”, ou algo parecido.

– Você não teria mesmo se esquecido, pois ficou marcada entre manchetes sensacionalistas e de duplo sentido. Devoradores de palavras, como você diz, embolaram-se junto às bancas, leram a manchete, fizeram a interpretação, cada um à sua maneira, e saíram a espalhar tudo o que imaginaram, menos a verdade contida em pequeno texto interno, que só pôde ler quem comprou o jornal.

Rindo muito, Tatão completa o relato do amigo:

– Imaginem a frustração daqueles que compraram o jornal. A verdade contrariava tudo que a imaginação produzira a partir da manchete. A menina em questão passara mal depois de comer “cachorro quente”, suspeito de estar estragado. Naquele dia, o jornal, que costumava encalhar nas bancas, fez circular edição extra!

– Nesse tal jornal – reage Dorinha – com certeza não trabalhava mulher, porque somente homens são capazes de produzir algo tão sórdido. E aposto que entre curiosos e leitores a maioria era de homens.

– Bem, o que se quer dizer é que palavras, bem ou mal colocadas, produzem efeitos diversos, de acordo com a imaginação e a interpretação de cada um – conclui Tatão.

– O engraçado – volta Dolores – é que falamos de duas palavras empregadas erroneamente, ambas, pela Previdência Social. Anteriormente, falamos do aposentado, denominado “beneficiário” por aquela instituição governamental. Sabe-se que “beneficiário” é quem recebe algo de graça, sem ter contribuído para merecer a concessão. Assim sendo, o aposentado que contribuiu, previamente, por longos anos, não se classifica como beneficiário. Ele não recebe nada de graça. O termo correto é mesmo “segurado”, ainda que este não esteja tão seguro sob os critérios adotados pelo INSS.

E Quinzão observa:

– Muito a Previdência Social ainda abusará da fragilidade social do aposentado, e, enquanto não souber LER, o cidadão será manipulado pelos detentores do poder, em todos os setores. Tudo isso é questão de pura e ampla educação, da qual carece toda a nação.

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