Coisas de ontem... e de hoje CXXIII

26 de Outubro de 2014
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

Manelão, que se mantém há algum tempo dentro de sisudez moderada, abstendo-se da galhofada, explode em gracejos ao ouvir as explicações quanto ao mito da manga com leite e sua origem. Ele se põe de pé, abre os braços, movimenta-os de um lado para outro em direção ao grupo, para conseguir silêncio e atenção sobre si. Na sequência, ergue o punho direito fechado e fala:

– Diante do que ouço, lanço meu protesto. Fui enganado em toda minha vida! Quantas mangas deixei de comer, lambuzando-me toda a cara daquele suco amarelo! Lá em casa, a mamãe e minhas irmãs, sabendo que eu gostava demais de manga, faziam verdadeira guerra contra a fruta. Quero reparo, quero as oportunidades perdidas de volta!

– Vá se queixar ao bispo! – brinca Dorinha – E deixe de exagero, dizendo que foi enganado em toda a vida. Como toda a vida, se você continua vivo? O engano se deu em apenas parte dela.

– Fui vítima de propaganda enganosa.

– Então, vá ao PROCON – volta Dorinha.

– Sacanagem! No tempo do onça, uns e outros armaram essa mentira e, até hoje, há quem nela acredite, por puro medo, o mesmo diante da bomba terrorista que, posteriormente, descobre-se ser falsa.

– Chiii! Se sua reclamação fosse séria e a moda pegasse, este mundo viraria um pandemônio, pois o que há de mentira, tida como verdade... – é observação feita por Quinzão, logo emendada por Tatão:

– Mas, voltando à questão do voto nulo, garanto que poucos se lembrariam de que seu conceito junto ao eleitorado se mantém graças à mentira; falso, porém imposto como verdade. Devido à má educação recebida e à falta de genuína consciência cidadã, o indivíduo só detecta banalidades em seus prejuízos na interação dentro da sociedade e na relação com o poder constituído. Ele é, sutilmente, manipulado, levado a crer naquilo que querem que creia, para manter o status quo, manter o poder nas mãos dos que o detêm.

Dolores intervém:

– Disso conclui-se que, na verdade, somos meio cidadãos!

– Infelizmente, sim! Veja os fundamentos históricos na formação da nação brasileira. Fracassada, no início, que contou com a abertura do território a aventureiros inescrupulosos e introdução de excluídos da sociedade europeia, a colonização teve prosseguimento com a prática da escravidão. Negros, seduzidos por meio de miçangas materiais, foram arrancados de suas famílias, grupos e nações, na África, e trazidos para cá como escravos. Os primeiros, devedores ao poder em sua origem, e os segundos escravizados pelo mesmo poder, em seu destino, resultaram na população de hoje, cativa politicamente, mediante distribuição de miçangas, ditas sociais. Dentro dessa sociedade, formada quase aleatoriamente, desenvolveu-se uma face produtiva e ansiosa por amplo retorno aos seus esforços, porém asfixiada por impostos, que deveriam responder àqueles anseios, se não fossem desviados pela e para a corrupção.

– Somos meio cidadãos, como diz a Dolores, a viver numa falsa democracia, na qual predomina a inversão de valores – complementa Quinzão – Políticos, fingindo legislar, criam leis que mais protegem bandidos, cujas ações não cessam nem quando, eventualmente, apanhados pela Justiça, em detrimento do cidadão trabalhador ao qual se paga salário inferior à benesse destinada às famílias daqueles.

– Leis fajutas, aparato policial inócuo e Justiça inoperante são efeitos, que não cabem ao eleitor resolver – adverte Tatão – ninguém direciona bala depois de disparada. Cabe ao eleitor cortar o mal pela raiz, rejeitando o sistema que aí está. E a rejeição está no voto nulo. Não importa que tenham dado interpretação oportunista ao art. 224 do Código Eleitoral porque governo “eleito” por minoria será o atestado da falsa democracia em que vivemos. Sob o foco internacional, correção de rumo deverá ser feita e, então, nova era poderá se inaugurar nos modos de o próprio povo decidir sobre seu futuro.

– A primeira mudança deve ser o reconhecimento do direito de o eleitor votar ou não votar, abolindo-se o voto obrigatório – sentencia Dorinha.

– Isso é o mínimo, Dorinha! – diz Tatão – entre as mais importantes inovações, considero o direito de se candidatar, mesmo não sendo filiado a alguma agremiação partidária. Se o eleito pode se desvincular do partido e continuar no exercício do mandato, por que a exigência da afiliação? Exclusão do cidadão não filiado contraria o princípio dos direitos democráticos! Com o reconhecimento desse tipo de candidatura, pode-se pensar na democracia direta, assentada na sociedade organizada, porque PARTIDOS POLÍTICOS JÁ FIZERAM MAL DEMAIS À HUMANIDADE!

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