Coisas de ontem... e de hoje LIX

15 de Junho de 2013
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

Percebe-se que festas juninas ou “... de fogueira” é assunto do gosto do Manelão, que se põe muito empolgado a rever suas experiências juvenis com relação a tais folguedos. E, antevendo momentos de mais risos com suas chacotas, todo o grupo se volta para ele. É só esperar... enquanto isso, dá-se-lhe corda. Quem o provoca, depois de ouvi-lo falar sobre as “bombas de bambu” é a Lazinha:

– Já se vê que, naquelas festas, você ficava por conta de aprontar. Nem tomava conhecimento da dança, que tanta atenção chamava.

– Realmente, não achava graça naquela coisa comandada por sujeito a dizer palavras um tanto estranhas. Para mim, aquilo era coisa de maricas. – Chiquinha o repreende:

– Êh! Agora você dá uma de “zé mané”! Palavras estranhas, às quais se refere, são da língua francesa estropiada pelo linguajar do caipira brasileiro, e, os modos da dança vêm dos salões elegantes. A dança, tão popular nas festas juninas, constitui arremedo ou sátira às festas de salão dos nobres. – Mas, Manelão não se conforma e ataca:

– O tal marcante gritava “tuuu”, a gente pensava que uma pessoa atenderia ao chamado. Entretanto as duas alas de todo o bando marmota, de mãos dadas e a rebolar, aproximavam-se a ponto de quase uma umbigada coletiva. – Para ilustrar o que diz, Manelão, de pé, arremeda o passo da dança com meneios e caretas. E a turma cai na gargalhada. Dolores se apressa para esclarecer ao Manelão:

– Esse “tu” não é o pronome pessoal do Português, mas, sim, a pronúncia de “tous” que, em Francês, significa “todos”. Por isso, todo o conjunto respondia ao marcante. Naquela época todo o comando da quadrilha se fazia por palavras francesas “caipirizadas”. Hoje, foram substituídas por palavras do vernáculo.

– Pode ser, mas continuo avesso à dança da quadrilha!

– Quanto ao nome da dança existe estranha curiosidade – diz Chiquinha.

– De que você fala? – pergunta Narita.

– Nesta região era mais conhecida como “coleção”. Parece-me que só aqui e não achei explicação para esse nome.

– Deve ser por vergonha de dizer quadrilha – atravessa Manelão – naquela época, quadrilha era quase palavrão. Perdida a vergonha de ser ladrão, quadrilha se tornou palavra comum. Aliás, ladrão até ganhou status na qualificação. Nos BOs é citado como autor, assim como escritor é autor de livro, benfeitor é autor de boas ações. Ladrão agora é pejorativo e discriminatório! A definição correta agora é “cidadão autor de furto”, ou de roubo, conforme o caso! Interessante observar que a diferenciação entre furto (subtração sem uso da violência) e roubo (subtração mediante força ou violência) só existe na área jurídica. Nos dicionários da Língua Portuguesa, os dois vocábulos praticamente se igualam.

– Mas, quanto à “coleção”, alguém sabe dizer algo sobre isso? – volta Chiquinha. Quem responde é Tatão:

– Também, pelo que sei, o termo “coleção” para a dança da quadrilha não era usado em outros lugares.

– Então, Manelão, se você não gostava da quadrilha, ou “coleção”, e achava os fogos infantis demais, de que você gostava? – é a curiosidade da Dorinha.

– Gostava muito da música de sanfona e vibrava com a movimentação de gente. Sempre gostei de estar no meio de pequenas multidões; grandes, não, pois me dão medo. Afora a quadrilha, havia o bailão, hoje denominado forró. Do bailão eu gostava, claro! Outra atração, das festas juninas de então, eram os balões, cujo perigo ainda não era considerado. Mas, nunca consegui me enfronhar na arte, pois os que os faziam e soltavam, percebi, constituíam grupo fechado. Não davam atenção a quem, de fora, mostrasse algum interesse. Contentava-me em assistir, de longe, a atividade dos aficionados.

– Interessante sua observação quanto ao caráter do grupo dos balões – interfere Tatão – Quando a prática ainda era livre, o grupo já se fechava em segredos. Imagine agora, que se tornou atividade clandestina, condenável devido aos riscos de incêndio e ameaça à segurança da navegação aérea! Os baloeiros, onde atuam, reúnem-se em grupos fechados, dotados de autoproteção e determinados a desafiar a lei, as autoridades e a segurança coletiva.

– Mas, é pena que o balão junino ofereça o mesmo perigo que os grandes balões desses profissionais à margem da lei – comenta Dolores. E eu me surpreendo por não ter surgido, até hoje, alternativa à bucha ou tocha de fogo, que é a fonte do perigo.

– Existir, até que existe; o que falta é informação. E essa desinformação parece conveniente para que prevaleça a proibição dos balões – conclui Tatão.

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