Coisas de ontem... e de hoje LVIII

09 de Junho de 2013
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

A dúvida levantada pelo Manelão com relação ao correspondente masculino de “babá”, segundo “gramáticos” do Palácio do Planalto, provoca comentários maliciosos e muito riso, mas, há quem não queira dar prosseguimento ao assunto, polêmico por si só e estranho ao que o grupo gosta de discutir. É Narita quem faz a conversa voltar ao tema anterior:

– Falava-se de fogo e reuniões em volta dele, no interior das casas, costume que desapareceu ao longo tempo, à medida que novos meios de entretenimento se introduziram com avanço da tecnologia. O que aconteceu dentro das casas repetiu-se fora delas: também a tradição das festas de fogueira desapareceu.

– Se o que você chama festa de fogueira é a festa junina, ela não desapareceu; há tantas delas todos os anos – contesta Dorinha, imediatamente criticada por Dolores:

– Desapareceu, sim; isso que aí está não passa de arremedo do que foi; nem merece ser chamada pelo mesmo nome. A festa quase espontânea de cunho, muitas vezes, familiar, deu lugar a evento caça-níquel, no qual o que conta é o lucro.

– Narita e Dolores estão com razão – é Tatão a interferir, acrescentando – tais festas eram, tradicionalmente, realizadas por famílias que tinham entre os seus membros pessoas com os nomes Antônio, João ou Pedro.

– E, atualmente, além de São João, pouco se fala nos outros dois santos de fogueira – observa Lazinha.

– Três – corrige Chiquinha.

– Três? e qual o terceiro, ou quarto? – é a Dorinha novamente.

– Embora de tradição menos forte que São João e Santo Antônio, ou mesmo São Pedro, Sant’Ana, dia vinte e seis de julho, era também celebrada com fogueira em muitos lugares – explica Chiquinha.

– Mas aí a festa não mais é junina e, sim, “julina” – rebate Dorinha. E Tatão a contradiz:

– Na verdade, tais festas são chamadas joaninas, por alguns, em alusão a São João, porém são mais conhecidas como juninas, porque os santos celebrados têm seu dia em junho. Santo Antônio se celebra, dia treze; São João, dia vinte e quatro; e São Pedro, dia vinte e nove. Este último se festejava até com feriado. Entretanto, mesmo sendo realizadas fora do mês de junho continuam a ser “juninas”, pois o termo se tornou genérico. São eventos do mesmo gênero, não importa o mês de sua realização.

– Gente, pode-se qualificar como crime o que se fez contra essas festas; totalmente desfiguradas, elas não lembram, em nada, o que eram na minha juventude – reclama Dolores – e, enquanto isso, tentam introduzir, em território nacional, usos, costumes e festas de outros países! Naquela época, os próprios preparativos eram considerados festa; toda a família envolvida em entusiasmo e expectativa de sucesso, uns a cuidar dos doces, com destaque para o pé-de-moleque, outros da canjica ou do quentão. Havia também os da decoração, a cuidar de bandeirolas, arcos de bambu com arranjos florais, etc.

– E a fogueira? – lembra Manelão – Junto a outros com a mesma disposição, eu sempre me envolvi com ela. Aprendi com os mais velhos que a fogueira deve ser armada com toras de madeira bem seca, sendo-lhe acrescentada, no interior, lenha mais fina e palha para o início do fogo. Toras de madeira garantem fogo por muito tempo, ainda que labaredas não se mostrem e cinzas tudo cubram. Depois de queimada a lenha mais fina, quando menos chamas havia, era a vez de assar batatas, pinhões e tudo mais que pudesse ir às brasas. Era também o momento de outra brincadeira, às vezes reprovada por outros, devido aos riscos de queimadura. Gomos de bambu verde eram previamente enchidos com água, arrolhando-se o furo numa das extremidades com pedaço de caule, também verde e bem resistente. Lançados à fogueira, tais gomos explodiam com grande barulho, depois de algum tempo.

– É aí que mora o perigo – adverte Tatão – a explosão pode lançar brasas à distância e atingir pessoas. Tal brincadeira era mais perigosa que os próprios fogos então usados. Fogos pesados e barulhentos eram pouco usados; eram mais os foguetinhos leves, bombinhas, o temido busca-pé e fogos ornamentais, como as rodinhas e fogos-de-bengala, por exemplo. Ah! e havia o espanta-coió! Por incrível que pareça, os fogos eram feitos mais para o público infantil.

– Era por isso mesmo que a gente apelava para o bambu; aquela coisa de bombinha, rodinha com fogo colorido e tudo mais não combinava com nosso espírito, que era do fazer diferente.

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