Coisas de ontem... e de hoje LXI

01 de Julho de 2013
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

Àquela altura do debate em torno das festas juninas e tudo o mais com elas relacionado, Quinzão, mostrando-se um tanto inquieto, atravessa o curso da conversa:

– Pessoal, não é indiferença em relação ao assunto em curso, mas viram televisão, hoje?

– Eu vi parte do jornal – observa Mário – você se refere às manifestações populares nas grandes cidades?

– Também eu vi; parece que o gigante se levantou, como dizem comentaristas – acrescenta Dolores.

Manelão, ainda de pé, refuta:

– Levantou coisa nenhuma! Por enquanto, abriu os olhos; apenas acorda de seu sono letárgico, em berço infestado de pulgas, muquiranas e percevejos, dos quais, para se livrar, haverá que dar violenta sacudida para, de fato, ficar de pé.

– Também, gente, são mais de quinhentos anos! – comenta Lazinha, que prossegue – o curioso é que as primeiras manifestações foram extremamente violentas e depredatórias, apresentando como motivo os vinte centavos acrescentados à tarifa de ônibus. – Tatão ouve e dá sua opinião.

– Quando vi referências à majoração da tarifa, veio-me a suspeita de que aquela não seria a verdadeira razão, para tanta violência. Algo mais significativo estaria por trás de tudo. E foi o que se mostrou nas manifestações posteriores com cartazes com cobranças de direitos, críticas aos políticos e ao sistema, críticas à gastança governamental, etc. Daí para frente o movimento ganhou a simpatia da sociedade. Ainda existe violência, mas é mínima, se considerado o número de pessoas nas ruas, e restrita a grupos isolados, facilmente identificáveis pela polícia. As próprias manifestações, por intermédio de seus idealistas, têm combatido essas infiltrações oportunistas, que se sabe, têm origem criminosa.

– Mas, porque teriam sido puramente violentas as primeiras manifestações? – indaga Narita a Tatão, fazendo-o interromper o discurso.

– Assim como lá fora, em diversos levantes coletivos, esses protestos foram organizados por meio das redes sociais, na internet. Tenho a impressão que as manifestações não seriam para agora, porém foram antecipadas pelo que se poderia chamar a “banda podre” do movimento. Ao ver sua bandeira ser usada de maneira infame, a verdadeira face do movimento se revelou, logo em seguida, virando do horror à simpatia a reação da sociedade, naqueles primeiros momentos. A tarifa do transporte público foi apenas o gancho.

– Pelo que se percebe, o movimento não tem lideranças visíveis e nem tampouco os protestos têm alvo único – diz Quinzão – A espontaneidade é sua característica principal, refletindo isso em cobranças difusas, ou seja, cobranças e críticas de naturezas diversas.

– Além da aparente espontaneidade, característica bem marcante é o consenso quanto ao apartidarismo nas manifestações – observa Chiquinha – basta alguém desenrolar bandeira de partido para que manifestantes, em volta, se lancem sobre o infeliz e o façam desistir da ideia, quando não lhe tomam e rasgam o objeto.

– É a demonstração de que o povo não confia em partidos políticos e rejeita todo o sistema, cujo arcabouço se constitui por obra e graça das agremiações partidárias – explica Tatão.

– Chegam a pedir a extinção de todos os partidos – adianta o Mário – e quanto a isso até político, de razoável peso no segmento, fez o mesmo ao ver a repulsa dos manifestantes aos partidos políticos.

– Para ser simpático, na hora azeda, político faz qualquer negócio – brinca Manelão. E Tatão acrescenta:

– É bem verdade que brasileiro não é muito chegado a partido, na hora do voto, preferindo votar na pessoa, ainda que nele não confie. Mas, em movimentos realizados, em outros países, a mesma repulsa foi manifestada. Embora não pareça, o mundo tende à abolição dos partidos políticos.

– Está na cara o porquê de essa tendência não ser bem conhecida – ataca Dolores – À mídia, nas mãos dos políticos e a serviço do sistema político-partidário, não interessa que a verdade seja conhecida. Relata apenas casos pontuais, verificados nessas manifestações de rua. – E Manelão emenda:

– Quanto à escamoteação da verdade, não sei se vocês perceberam que faixas e cartazes de conteúdo mais contundente não são vistos na televisão. Estão a filtrar e escamotear o que lhes parece mais agressivo aos políticos, ao governo, ao sistema. São canalhas a proteger canalhas!

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