Coisas de ontem... e de hoje LXII

07 de Julho de 2013
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

A observação, feita por Manelão, de que críticas mais contundentes, aos políticos e ao sistema político-partidário, não eram mostradas pela imprensa, Dorinha redargúi:

– E como você sabe disso, Manelão, se não estava lá, e, como você mesmo diz, a imprensa não mostra?

– Você se esquece da internet, menina! Você se esquece das câmeras embutidas em qualquer celular, minigravadores ao alcance do consumidor mediano e toda uma série de recursos, que convertem cada cidadão em pequeno agente da mídia informal, desvinculada de qualquer esquema político-econômico; e que essa mesma mídia conta com veículo poderosíssimo: a internet, menina!

– Nooossa! até parece o Tatão a falar! Não sabia que estava enfronhado em internet – reage Dorinha, ao que Chiquinha explica:

– É o nosso neto; ele é bem entendido nessas coisas e gosta de compartilhar com o avô, aquilo que pode lhe interessar. Isso que o Mané diz eu também vi: muitas fotos de faixas e cartazes com críticas pesadas e endereçadas a quem as merece; coisas que todos sabem, mas a mídia faz de conta que não existe. E posso lhe garantir que o Mané, se quiser, em pouco tempo poderá estar conectado, tanto quanto o neto!

Tatão, apoiando palavras do Manelão e da Chiquinha, emenda:

– O constatado por vocês nessas manifestações verifica-se também em outras ocasiões; não só deixando de retratar a verdade, mas também forjando fatos ao sabor de interesses políticos ou de outros interessados na manipulação da opinião pública.

– Mas, isso é grave demais – observa o Mário, que pouco fala.

– Grave, porém tão corriqueiro como a correnteza debaixo da ponte! – Tatão prossegue:

– Falam tanto em democracia e liberdade de expressão, mas profissionais da imprensa são alijados de suas posições ou perdem o emprego por contrariar diretrizes determinadas por interesses entre a empresa e o governo. Há poucos anos, conhecido jornalista foi demitido por pressão externa e levado ao ostracismo por algum tempo, depois de denunciar e emitir opinião sobre irregularidades na administração pública. Até da internet seu nome foi varrido! Antes desse episódio, havia milhões de referências ao seu nome nos mecanismos de busca; depois disso, as referências caíram a apenas vinte, não diretas, mas em citações de terceiros. Tendo voltado ao exercício da profissão, porém sem o destaque anterior, hoje as referências sobem a pouco mais de setecentas e sessenta mil.

– Por isso digo, melhor viver entre pequenos do que entre grandes, porque entre estes o sofrimento, às vezes, é maior – opina Dolores, ao que Tatão replica.

– Mas quando um profissional desses silencia, voluntariamente ou sob coação, um sofrimento das camadas populares pode estar em criação ou sendo prorrogada sua duração. A diferença está entre a percepção daquele e a inocência destas. Ele sofre conscientemente e a população nem percebe a verdadeira causa do sofrimento. E podem estar certos que as manifestações, que ora se realizam por todo o país, em parte, são devidas a esses formadores de opinião. As manifestações populares são a soma das opiniões individuais, estimuladas pelos primeiros; são como chuva, que começa com pingos isolados, mais grossos, e aos quais vão se juntando outros e mais outros, até se tornar tempestade. E a tempestade vem para lavar tudo!

– Você quer dizer que o país está em vias de se limpar de toda essa sujeira? – indaga Narita.

– Sim. O movimento abalou o sistema e colocou agentes políticos de cabelo em pé! Basta agora um pouco de organização para que o povo reverta o quadro; para que transforme o exercício da política em missão nobre, capaz de atrair idealistas e expulsar a corja de aventureiros, encastelada no poder. Está na hora de extinguir todos os partidos e estabelecer a democracia direta, na qual os direitos de cidadania podem ser mais iguais.

– Mas, isso não seria o anarquismo? – pergunta Dolores.

– Anarquismo seria se fosse a abolição do estado, do governo. Não se trata disso. As instituições permaneceriam intactas. Somente não mais haveria partidos, causadores de instabilidade política, colmeias (com o devido respeito às abelhas) geradoras de parasitas, facilitadores de oligarquias, células protetoras de políticos corruptos.

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