Coisas de ontem... e de hoje LXXV

05 de Outubro de 2013
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

Puxado pela Dorinha, todo o grupo “cai no pelo” do Manelão. Tatão é o que mais ri, dirigindo-lhe brincadeiras e tiradas filosóficas:

– Veja como a compensação, lei das mais justas no esquema universal, entrou em cena, tão logo se cometeu o abuso contra a natureza.

– Mas eu não afrontei a natureza; cometi, sim, maldade contra pessoas que, naquelas circunstâncias, estavam indefesas. O erro, do qual me arrependi, no mesmo momento, foi expor o Jacinto à ação danosa da urtiga.

– Você pensa que não, assim como o faz a maioria das pessoas em casos semelhantes. Entretanto, você se valeu, primeiro, da passividade inerente aos vegetais e, segundo, da característica específica da urtiga para molestar o rapaz.

– Agora, quem não entende mais nada sou – fala Dolores, perguntando a seguir: – que mal há em apanhar algumas folhas de uma planta? Não vejo por que envolver a natureza na história.

– Ninguém está a envolvê-la, mas, Manelão, sim, envolveu-a de forma ultrajante.

– Ora, Tatão, que drama! Não exageremos! – protesta Dorinha.

– Sem qualquer necessidade, apanhar folhas de planta se constitui em agressão à natureza, ainda que tal fato não gere consequências em cadeia. O que se constata é que o ser humano se acostumou à pretensão do mais importante entre os seres, na superfície da Terra, o que redunda em pouca ou nenhuma importância às demais manifestações da vida. Valer-se da urtiga para malfazer a outro ser seria o mesmo que “tirar castanhas das brasas com a pata do gato”, como diz o dito popular; ou valer-se da ingenuidade de uma pessoa para prejudicar outra.

– E você acha, Tatão, que o ataque dos marimbondos foi compensação cobrada pela natureza? – indaga Dolores.

– Analisados os fatos, imparcialmente, chega-se à conclusão que não foi pura casualidade ou coincidência. Façamos uma pergunta: por que os dois subiam apressados, no meio do mato, sem o cuidado de olhar por onde passavam? Respondo: porque fugiam de situação criada por eles próprios. Se não fosse por isso, certamente teriam tomado rumo distante da rota dos marimbondos. Manelão, mentor e executor da má ação, foi quem bateu na casa dos insetos e, consequentemente, sofreu suas picadas. Seu parceiro, cúmplice por ter consentido e nada ter feito para impedir o ato, sofreu susto, não deixando de também “pagar” pela omissão. E o mais impressionante: a presença do ácido fórmico na urtiga e no marimbondo. Até mesmo a rejeição momentânea ao Jacinto, manifestada por seus parceiros, se repetiu no companheiro do Manelão.

Manelão, atento às palavras do amigo, fala:

– Engraçado; enquanto o remorso me roía pensei justamente ter sido castigo.

– Não se trata de “castigo” – rebate Tatão – é a natureza a compensar ofensa recebida. Nada, nem ninguém escapa à compensação, que atua imparcialmente, não importando quem, o quê e em que condições tenha violado seus princípios.

Tatão faz uma pausa e pergunta:

– E o seu amigo, não sofreu nenhuma picada?

– Quando caiu, pensei que também ele tivesse sido atacado. Vi que nada sofrera quando, depois de algum tempo, se levantou e disse estar bem.

– E ele não lhe disse mais nada?

– Não, por quê?

– Suspeito que ele não tenha caído, porém se jogado ao chão. Nunca tive oportunidade de testar, mas já ouvi dizer que, diante do ataque iminente de abelhas ou marimbondos a estratégia correta é se jogar ao chão, para escapar às picadas. Dizem que os insetos só atacam no nível em que estão, não descendo ao chão. Se seu amigo também tinha essa informação, é provável que tenha empregado a tática. E como vocês chegaram em casa?

– Antes de tomar rumo de casa, tive de tirar toda a roupa que, bem folgadas àquela época, facilitavam a entrada de insetos. Os marimbondos me picaram até os “documentos” de macheza.

– Mais uma vez, bem feito! – atravessa Dorinha

– Depois disso acabamos de subir pelo mato, então muito denso, para alcançar a região, onde, hoje, se situa a Vila Alegre. De lá, descemos até alcançar o perímetro urbano.

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