Falta adubo nas raízes

06 de Maio de 2015
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

O mundo humano, sensível e consciente de sua posição no esquema universal, assiste estarrecido à tragédia da emigração em massa, do norte da África, através do Mar Mediterrâneo, em busca do mínimo em condições de sobrevivência no continente europeu. Ainda que fossem animais de outras espécies, não deixaria de ser tragédia lamentável, a requerer intervenção humana para que cessasse. Mas, são seres humanos tais quais os que se atropelam nas grandes metrópoles, bem situados economicamente e sem quaisquer problemas na condução de suas vidas. Carregam, porém a marca da pobreza de origem, países mal situados economicamente, mal dirigidos politicamente e não, raras vezes, assolados por guerras fratricidas. O desespero, na luta pelo mínimo digno e desejável, empurra hordas de migrantes mar adentro, sem avaliar os riscos oferecidos por frágeis embarcações superlotadas, que não escapam ao perigo de águas revoltas. Os que escapam à tragédia no mar ainda têm que enfrentar as barreiras, interpostas à imigração, contra as quais muitos batem e voltam ao ponto de partida. Mas, os que conseguem furar o cerco não ingressam no sonhado paraíso, pois apenas trocam o mundo cruel de seus países de origem por preconceitos, discriminações e o natural distanciamento entre as culturas, quando não hostilidade e ódio, que os expõe à expulsão ou morte.

A discussão do problema se dá entre duas correntes político-ideológicas: a que defende a aceitação dos imigrantes e a dos que a rechaçam, radicalmente. A rejeição, pura e simples, configura ato inaceitável por quantos se prezam como seres humanos, mas a aceitação como gesto de piedade, sem que os acolhidos tenham um suporte capaz de integrá-los à nova realidade, também não se enquadra dentro do quadro verdadeiramente humano.

O indivíduo cria vínculos de todas as naturezas onde nasce, formando então sua identidade cultural, com a qual, nem sempre consegue manter-se ligado onde é recebido. O primeiro golpe sofrido é ver-se obrigado à emigração por força de circunstâncias externas, alheias à sua vontade, pois para o indivíduo, não desejoso e preparado para tal, a emigração forçada é violência à sua dignidade. Integrar-se a outros costumes, outros modos de vida, constitui quase uma renegação de suas origens, sabendo-se ainda que pode não ser bem aceito, embora as aparências tentem mascarar a realidade. Por sua vez, o indivíduo local, o anfitrião, tem lá suas razões e suspeitas para não aceitar o novo e estranho, mormente nas atuais circunstâncias da migração em massa, forçada por série de fatores; sem falar no aspecto social, notadamente quanto ao mercado de trabalho que, em desequilíbrio, pode gerar efeitos desfavoráveis, desta vez para os naturais. Vê-se que o desconforto é comum às duas partes e, longe de ser extinto, pode perdurar e se agravar, sempre em desfavor do imigrante.

A solução definitiva talvez estivesse na inversão da travessia do Mediterrâneo, levando à África mais pobre oportunidade de fixação de suas populações e de desenvolvimento, por meio de recursos e pessoal especializado. E que essa travessia se multiplicasse, em todos os oceanos, convergindo de todos os países, para a África, a compensação por tanta exploração de que já foi vítima; tudo sob a supervisão da ONU, para que não se estabelecesse nova espécie de colonização. Utopia? Não, se os dirigentes mundiais pensassem mais em termos humanos, sem qualquer conotação politico-ideológica; se pensassem e convertessem esforços belicistas em colaboração pró-desenvolvimento da África pobre.

Mas, se em nível local, nada se faz para fixar o indivíduo em sua região de origem, deixando que se inchem as metrópoles com a expansão de favelas, em nível internacional, a sugestão cai mesmo no campo da utopia. Seja em nível local, regional, nacional ou internacional, a tendência natural do indivíduo é fixar-se junto à família, ao seu círculo, às suas raízes, podendo deslocar-se, por livre opção ou por vínculo a exigências do trabalho. Mas, assim como na África em relação à Europa, em território tupiniquim as regiões mais pobres não contam com uma política efetiva de desenvolvimento, que contemple a fixação das populações em suas respectivas regiões, especialmente no meio rural, o que resulta em êxodo contínuo, cujo exemplo mais marcante é o da população nordestina com destino a São Paulo. O município, que seria a célula da nacionalidade, não é visto e gerido como um todo, concentrando-se as atenções político-administrativas no distrito-sede, em prejuízo de todo o restante do município, que é tratado como quintal da cidade. Não encontrando resposta aos seus esforços de se prover e promover onde nasceu e vive, o indivíduo, despreparado para uma mudança de rumo, deixa seu berço natal e se muda para centro maior, onde “tentar a sorte”, conforme ele próprio diz. Mas a roda da sorte não contempla a todos! E as condições sociais da cidade grande pioram um pouco mais!

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