Golpe à sorrelfa

17 de Dezembro de 2011
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

Com a atenção voltada para a tal Copa do Mundo, evento para o qual não está preparado, mas quase se impôs como sede em 2014, levado pelo irresponsável ufanismo futebolístico, o país corre risco de golpe certeiro em sua já duvidosa democracia. Em outras circunstâncias, o assunto estaria em debate e a merecer destaque na mídia; passeatas já teriam mobilizado milhões de pessoas em todo o país, greves teriam pipocado sob o comando de sindicatos de esquerda e a quebradeira estaria instalada.

Foi assim no movimento das “Diretas Já”! Mas, o momento é outro e o ideal da democracia aberta, com eleições diretas para todos os cargos elegíveis, nos três níveis do Executivo e Legislativo, anistia “ampla, geral e irrestrita” para os que se envolveram na subversão e consequente repressão, não conta mais. O que conta é hipocrisia dos, então, ditos arautos da democracia, que fazem ou tentam fazer justamente o oposto do que apregoavam, àquela época. A anistia, por exemplo, continuam a querê-la ampla, geral e irrestrita, mas somente para os antigos subversivos e guerrilheiros, muitos dos quais a mamar nas tetas do governo e outros a auferir polpudas pensões. Aos que tombaram no cumprimento do dever, vítimas dos que empunhavam armas contra o governo, sobrou o desprezo. Se houve excessos e desrespeito à vida humana não foi só por parte da repressão. O ódio ditava as ações nos dois lados; ação e reação!

Agora é a própria eleição direta que, em parte querem derrubar e, com ela, o direito de o vice-presidente, eleito pelo povo, suceder ao presidente, em caso de morte ou impeachment. Propositores justificam a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) por ser o vice-presidente eleito com os votos dados ao titular da chapa e não a ele próprio. Ora, se é por isso, por que não a volta do antigo sistema, no qual a eleição do vice era desvinculada da do titular?

De acordo com a PEC 32/06 aprovada, dia 3 de novembro último, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, a parte relativa à sucessão, em caso de vacância do cargo de presidente da República, ficaria assim redigida na Constituição: “Art. 81 vagando o cargo de presidente da república, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a vaga. § 1º ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição será feita trinta dias depois da abertura da vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei. § 2º em qualquer dos casos, o eleito deverá completar o período de seu antecessor.”

Deem a isso o nome que quiserem, mas não deixa de ser golpe muito maroto, que dará aos congressistas o poder de eleger quem eles quiserem, à revelia do povo. Condena-se o regime militar por ter impedido vice-presidente de assumir no impedimento do titular e, em pleno regime, dito democrático, querem alterar a Constituição para fazer a mesma coisa. E o pior é que toda a mídia está na moita, a fingir que nada acontece, ou se tratar de “maracutaia” política em republiqueta qualquer, que não nos diz respeito em circunstância alguma. Algo mais podre pode estar por trás dessa destrambelhada pretensão, que ainda deve passar pelo crivo do plenário do Senado e da Câmara Federal. Se essa desavergonhada proposta passar, que se cuide toda a nação, pois este será o primeiro passo para outras alterações que virão, por iniciativa de políticos, que se elegem como representantes do povo, virando-lhe as costas, em seguida, para legislar ao sabor de suas vaidades, ambições desmesuradas, tudo em conformidade com o grupo político-partidário a que estão vinculados. A sabedoria popular diz que “de grão em grão, a galinha enche o papo”. No reino da malandragem política, pode-se dizer que de alteração em alteração, na Constituição, os espertos tiram a liberdade da nação! Tudo em nome do povo, que figura como marido traído, o último a saber!

Alteração na Constituição deveria ser feita, à semelhança da hondurenha, para impedir que mudem determinados dispositivos legais, garantidores do mínimo de democracia, enquanto ela não se estabelece em sua plenitude. Em plenitude, a democracia só existirá quando mais existir partido político e a política for conduzida diretamente pela sociedade organizada, sob a soberania da Justiça Eleitoral. O Executivo não mais estará atado a qualquer maioria de cunho partidário, mas administrará de acordo com decisões do parlamento, cujos integrantes estarão sujeitos ao poder da avaliação e cassação de mandato nas mãos do eleitorado. Políticos profissionais não percebem, mas o mundo caminha rapidamente para mudanças. E uma delas será o restabelecimento do conceito da democracia plena e direta, forma como surgiu na antiga Grécia. Partidos políticos já fizeram mal demais à humanidade!

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