Incoerência das incoerências

11 de Março de 2015
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

Sob o espanto e o medo de ver arruinar-se ainda mais o combalido ambiente social, de um lado, e do outro, o regozijo dos que anseiam por uma sociedade libertina, ou disso próxima, pipocam aqui e ali atos de condescendência estatal à maconha, retirando seu uso e abuso da área sombria do crime. Sua descriminalização, discutida há anos, agora aplicada em vários estados norte-americanos e em todo o Uruguai, depois de experiências também condescendentes em países europeus, causa polêmica. Se alguns dizem com isso dar fim ao tráfico, a grande maioria teme a massificação do seu uso, abrindo espaço para drogas mais letais, às quais o tráfico dirigiria suas ações. O discurso da descriminalização cresce e se difunde, tendo como veículo os ambientes artístico e estudantil, escorado em políticos e bafejado por interesses ocultos, os mesmos que impedem de o “tubarão” traficante ser preso, mas não garantem a vida do “aviãozinho” da favela. O lado benéfico do embate entre o discurso da descriminalização e as forças oponentes é a possível evidenciação dos interesses por trás do movimento, que não se prende a nenhum país, porém tem seus tentáculos voltados mais para uns que para outros, conforme conveniências, assim como os grandes conglomerados econômicos.

Ainda que não fosse a maconha nociva à saúde, ao contrário do apontado por estudos aprofundados do assunto, só a possível alteração de comportamento do usuário já seria suficiente para listá-la como objeto de risco, ao qual fica exposta a sociedade. Assim como o álcool, os efeitos da maconha no organismo podem variar de indivíduo para indivíduo, mas, isso não justifica sua liberação, ainda que parcial, com base no menor impacto da droga, pois deve prevalecer o interesse coletivo, a saúde como bem de todos, a paz e a segurança. Nem todos chegam à dependência, porém os sérios riscos oferecidos pelo uso da erva recomendam política de prevenção, a começar por educação, seguida de proibição, combate ao uso e tratamento específico para os diagnosticados como dependentes. Interessante observar que o combate ao uso redunda em combate indireto ao tráfico, pois sem usuário não há mercado para a droga. Quanto ao tráfico em si, é tratá-lo com mão de ferro, mediante leis mais duras e penas severas (excluída a de morte) que desestimulem as iniciativas na área. Grandes fortunas são feitas por traficantes à custa de muito sangue derramado sob o signo da violência, em paralelo com a perda de profissionais, desviados de suas carreiras a partir dos bancos escolares, sem falar na desestruturação de lares, abandono de filhos e toda sorte de malefícios que a droga proporciona. Não merecem, pois, condescendência, indivíduos que vivem à custa da desgraça de milhares ou milhões afetados pela droga.

Testemunho mais eloquente e contundente contra a legalização da maconha é dado por ex-usuários, ou tentam deixá-la, que apontam o sofrimento, enquanto estão sob o vício da erva até que ela se torna insuficiente para satisfazê-los, obrigando-os a migrar para drogas mais fortes. A grande maioria, entre usuários e ex-usuários, aponta a simples curiosidade, em torno da maconha, como origem da dependência que o escraviza às drogas, ainda que, em muitos casos, haja tentativa de escapar ao vício. Também como nos casos do álcool e do tabaco, dependentes de drogas ilícitas têm dificuldades em deixá-las, primeiro pela exigência do próprio organismo, que cobra consumo, seguida pelo meio onde o usuário circula, ou seja, seus companheiros de infortúnio, que o desestimulam. Por fim vem o traficante que, tendo-o como cliente alienado e comprador compulsivo a lhe significar fonte de renda, faz de tudo para não perdê-lo. Chega a adiantar a droga ao usuário para, mais tarde, ser rigorosamente cobrada, até com a morte, se necessário.

O lado positivo da cannabis sativa (maconha) está em propriedades medicinais, comprovadas em medicamentos produzidos a partir dela e utilizados no *tratamento do glaucoma; melhora do apetite no tratamento de portadores do HIV; dores crônicas; inflamações; esclerose múltipla e epilepsia entre outras doenças (fonte: blog do médico Dráuzio Varella). Entretanto não é por isso que se deve liberar o consumo da erva in natura, pois uma coisa é o seu consumo, dito recreativo, de forma irresponsável, e, outra é o direcionamento de seus princípios ativos para a terapia, desde seu processamento em laboratório farmacêutico até seu consumo mediante prescrição médica controlada. Que não confundam alhos com bugalhos!

Tenta-se ainda argumentar a legalização do uso da maconha com base no tabaco e no álcool, também drogas maléficas, porém lícitas. E é aqui que se pegam os defensores da maconha, porque um erro não justifica outro; consumo do álcool e do fumo de forma liberal é, infelizmente, erro consolidado, ao qual se dá combate com grandes recursos gastos, depois de constatados os prejuízos sociais e, especificamente, à saúde. Em tempo de combate ao uso do fumo e do álcool, legalização da maconha é o cúmulo da incoerência e zombaria à inteligência de toda a sociedade.

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