“Jecas do asfalto” sob a mira da lei

28 de Outubro de 2016
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

“Não há como um dia após o outro”, já diziam nossos avós, ou “um dia é da caça e outro do caçador”, para dizer que algo incomodante pode não ter a duração que a minoria espera, caindo por força da pressão da maioria, em respeito às injunções do bom senso coletivo. Concluindo este introito, registre-se, ainda de acordo com a sabedoria popular que “não há mal que dure para sempre”.

Desde que se permitiu a introdução, nos veículos, da “sonzeira” (som + zoeira) tecnologicamente denominada “som automotivo”, a comunidade verdadeiramente merecedora da classificação homo sapiens vem batendo na mesma tecla, a denunciar a estupidez dessas “tralhas elétricas” destinadas aos não embarcados no veículo. Isso, mesmo porque para os embarcados existe o rádio ou outro equipamento menor, que reproduz música ou o som que se queira, não havendo necessidade de toda a potência instalada, a não ser para impingir barulho ao público no entorno. Por muito boa vontade que se tenha, não se entende a razão desses equipamentos em veículos, se não com o propósito de atazanar pessoas e agredir a saúde da população.

Sente-se em todo o organismo, especialmente nos ouvidos, a pressão e vibração dos sons mais graves, cujo volume, invariavelmente, o operador mantém acima dos agudos. Além dos ouvidos, esse som agride o sistema nervoso, altera o humor da pessoa e pode ser o responsável por boa parte da violência que ocorre diariamente. Os que transitam com parafernália em excesso de volume não respeitam nem a hora do sono. A qualquer momento da noite, acorda-se com esse barulho infernal, que deveria ser coibido para o bem da saúde pública. Os que fazem questão de ter a tranqueira no veículo, e dela fazem uso a pleno volume, são na verdade jecas; jecas do asfalto! Ao contrário do jeca rural, humilde e consciente de sua ignorância, o do asfalto é arrogante e pensa que tudo sabe!

Não se critica a qualidade da música, ou daquilo por eles considerado música, porque gosto não se discute. Nesse aspecto, gosto e capacidade de apreciação são bem democráticos: uns gostam de belos olhos, outros gostam da remela! Na verdade, o apreciado pelos “jecas do asfalto” é bem pior, porque é puramente barulho chacoalhante; sons graves, situados acima dos agudos, espalhados a qualquer momento, sem qualquer respeito para com a coletividade.

Não é raro dizer-se que o Brasil é terra sem lei, em críticas contra a impunidade relativa a abusos e crimes cometidos, o que daria ao país feição de “casa da mãe joana”, onde todos mandam e ninguém obedece. Mas, não é bem assim, pois lei é o que não falta. A começar da Constituição, uma das mais longas do mundo, o Brasil tem lei para tudo e para todos, dando azo à expressão “cipoal de leis” muito do gosto de comentaristas e especialistas no campo jurídico. O que falta é mesmo autoridade, cujo conceito vai além da figura emoldurada pelo título, para se configurar na vontade política de exercê-la, ao cumprir e fazer cumprir o que diz a lei, não importa qual seja e a quem atinja. Em relação às leis, em si, há as que dão sustentação ao estado; por isso, mais rígidas e cobradas dos cidadãos, sobretudo dos pobres de recursos para ter bons advogados, enfronhados nas brechas propositalmente deixadas pelo legislador.

Pois é! Embora haja o Decreto-Lei 3.688/41 (Lei das Contravenções Penais) que, ainda na primeira metade do século passado, já dispunha de recurso para combate à perturbação do sossego público, os “jecas do asfalto” estão a desrespeitar a lei e direitos dos cidadãos, desde que a eletrônica lhes permitiu fazer o que fazem. Felizmente, depois de muita “água mole em pedra dura...” tanto bateu até furou! O CONTRAN, por meio da Resolução 624, decidiu, em favor da coletividade, reprimir o uso abusivo do som instalado nos veículos. Antes, para ser autuado por perturbação do sossego público, havia que provar por meio de medição, feita com o decibelímetro, que o som estava acima do permitido. Agora, pelo menos em tese, a farra acabou!

Basta o som ser ouvido por quem está do lado de fora do veículo para se configurar a transgressão. A partir de 1º de novembro, quem for flagrado pode perder cinco pontos na CNH e ser multado em R$195,23 (valor cobrado a partir de 1º de novembro).

Pergunta-se agora: a resolução será respeitada? A punição será aplicada? É proibido o uso do celular, enquanto dirige. No entanto, a transgressão continua firme. É proibido dirigir alcoolizado, mas continuam a dirigir e matar. No caso dos “jecas do asfalto”, entretanto, abuso e agressão são diretos contra a população, que deve se manter vigilante e colaborar com a Polícia Militar, denunciando infratores.

Doravante, quem se sentir incomodado por som automotivo tem o direito de se proteger e o dever de proteger o semelhante, chamando a polícia. E tenho dito!

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