Matreirice tupiniquim

05 de Maio de 2017
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

Cantado em prosa e verso como, alegre, cordial, solidário, inventivo, o indivíduo brasileiro tem essas qualidades apenas como fachada, na hora que lhe convém, ou pior, que convém a alguém que não ele. O que prevalece é a subserviência, ou submissão, escandalosamente escancarada ou sutil como convém aos hipócritas. O tipo brasileiro, moldado sob a ótica do colonizador que, a tudo e a todos, deitava os olhos como propriedade sua, varou o tempo na condição de pau mandado e, hoje, sob pressão de todos os lados a exigir-lhe o exercício da cidadania, está mais perdido de que cachorro caído do caminhão de mudança! Nem sabe o que seja cidadania!

Ainda preso ao medo, que lhe impunha o elemento colonizador, o tupiniquim tem uma relação distorcida com o aparato estatal, não cumprindo a lei porque seja de seu dever cumpri-la, porém por temor à penalidade, que o descumprimento pode causar. Não acordou para a responsabilidade cidadã que, tal como a todo universo de cidadãos do país, o faz provedor de recursos que, teoricamente, sob a administração do estado, devem ser redistribuídos em serviços para toda a coletividade. Não percebe que, de toda estrutura do país, uma parcela, ainda que minúscula, provém de sua contribuição, o que o torna credor de direitos de um lado e devedor de deveres do outro. Por não ter consciência de sua posição dentro da coletividade, sonega, descumpre a lei, corrompe, deixa-se corromper, não observa normas de civilidade e, a partir daí, faz do espaço público como se seu terreiro fosse. Comporta-se como se ainda em confronto com o colonizador, ao qual, segundo a lógica do colonizado, devia desobedecer e causar prejuízos, até que fosse libertado para caminhar com as próprias pernas.

Em rápidas pinceladas, é este o perfil do brasileiro, cidadão indefinido, manipulado, meio vaca de presépio, pronto para auferir benesses e vantagens, desde que com isso não se comprometa, pois responsabilidade não é o seu forte; que tudo venha de lá, mas nada daqui se vá! Sua cordialidade pode não ir além do momento favorável, isento de qualquer obrigação porque se, à sua frente, a desventura atinge o semelhante, quase certo que seu testemunho não se ouvirá, para defender ou livrar aquele de momentos piores. Quando, em grupo, se sente prejudicado por atos do poder público, ou na sua relação de emprego no setor privado, fala muito e brada aos céus por justiça. Quanto a isso, destaca-se nele característica peculiar por ocasião de manifestações contra o poder público: quem paga o pato é o seu semelhante, no enfrentamento de obstáculos, como ar poluído em decorrência de pneus e outros materiais queimados, tumultos, trânsito bloqueado, enquanto os responsáveis pelas mazelas nada sofrem em seus gabinetes Entretanto, na condição individual encolhe-se como a tartaruga debaixo da carapaça, a aguardar alguém que decida assumir os riscos próprios da situação. Faz o oba-oba em grupo, mas na hora do “pega-pra-capá”, não mais está aqui quem falou e reclamou!

Ufanista por natureza e por indução da política mais caradura enche-se de orgulho pelo futebol, ainda que perneta como demonstrado na última copa mundial, embasbaca-se ante o carnaval na Sapucaí, mas não é dos melhores qualificados no enfrentamento dos desafios tecnológicos, que mais se impõem a cada dia; prefere o diploma ao saber! É com diploma, nem tanto saber, que grande horda tupiniquim entra no rush dos concursos públicos, ávida por um lugar à sombra e resguardada das intempéries conjunturais, típicas do setor privado. Se uns fazem carreira, ao colocar seus conhecimentos a serviço da coletividade, fazendo jus ao que lhes cabe, outros fogem à responsabilidade, talvez como já se fizesse cá fora.

De dentro da administração municipal, em Ouro Preto, conhece-se esse tipo de comportamento da parte de quem emite demonstrativos de rendimentos para declaração do IRPF (Imposto de Renda Pessoa Física). Em lugar do seu nome como responsável pela informação, a pessoa tem colocado o nome do prefeito. Essa prática errônea não se prende à atual administração, pois foi observada em administrações anteriores, mas somente em Ouro Preto, desconhecendo-se ocorrência similar em outros municípios. Ao prefeito, seja ele quem for, de A a Z, tenha a origem que tiver, cabem outras grandes e graves responsabilidades, das quais não pode fugir, mas a responsabilidade direta sobre informações corriqueiras é de quem as emite. O funcionário, servidor, empregado, colaborador, seja do setor público ou do privado, é pago também para assumir responsabilidades. No trabalho, ninguém pode se esquivar de suas responsabilidades, e, muito menos lançá-las sobre os ombros de terceiros.

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