Namastê

15 de Junho de 2013
Valdete Braga

Valdete Braga

Recentemente, escrevi sobre o perdão através da visão budista. Uma amiga perguntou-me se eu consigo praticar. É claro que não! Eu adoraria conseguir, seria o ideal para todo ser humano, mas fazer o que, se ainda somos humanos? Podemos e devemos lutar para melhorar sempre, e fazer de cada dia um novo aprendizado. Mas eu jamais teria a pretensão de dizer que vivo a teoria da perfeição. Eu e minha amiga demos risada quando eu respondi que “Buda é Buda”. Podemos (e devemos) aprender com as lições dos Mestres, mas conscientes do quanto ainda estamos longe disto.

Tenho trocentos defeitos: sou turrona, teimosa, guardo mágoa (talvez o pior defeito) e por aí afora. Por outro lado, tenho também as minhas qualidades: não abro mão dos meus princípios, sou sensível, sou incapaz de prejudicar alguém intencionalmente (talvez a maior das qualidades). Nós todos somos assim, mistura do positivo e do negativo, e o que nos torna especiais é o privilégio da escolha. Não concordo quando alguém diz que “não teve escolha”. Sempre existe uma, nem que seja com a gente mesmo. Quando enfrento uma situação inevitável, procuro voltar-me para o meu interior. Aqui fora eu posso não ter escolha, mas quem disse que a minha alma está aqui fora? Pelo contrário, ela é especial e única, e sempre me dá a melhor escolha.

Não faço a menor questão de ser “boazinha”. Lembro-me de ter lido, não sei exatamente onde, que mais importante do que estar certo, é estar feliz. Concordo. Obviamente, é preciso dar as devidas proporções. Se a minha felicidade depender da tristeza de outro, ou for prejudicar alguém, é diferente. Mas desde que a pessoa não esteja prejudicando a ninguém, que ela seja feliz, ainda que não necessariamente certa.

Não estou fazendo nenhuma apologia ao egoísmo, pelo contrário. É preciso pensar no outro. O que não devemos é viver em função dele. A situação às vezes é desesperadora: decepção, injustiça, quem nunca passou por isto? Dependendo do que nos fazem, perdoar é muito difícil. Vemos por aí milhões de frases, pensamentos, textos, sobre isto. Mas sejamos realistas: perdoar incondicionalmente, só mesmo Buda, Jesus Cristo, Maria de Nazaré, gente deste naipe. Sim, porque eles foram gente também, com lados positivos e negativos. Mas por estarem muito mais perto da divindade, conseguiram sublimar o negativo. Quem sou eu? Quem somos nós?

Podemos tentar. Fazer de cada dia um degrau de uma escada infinita para o Bem. Mas, francamente: ainda subimos muito devagar. O nosso tempo no planeta chega ao fim bem antes do topo. Mas cada tentativa é válida. Cada novo dia, cada novo gesto de amor, cada degrau subido.

Jamais conseguirei praticar os ensinamentos de Buda ao pé da letra, mas acho que cada esforcinho é válido. Se alguém me machuca muito, quem sou eu para perdoar incondicionalmente como Buda, ou oferecer a outra face, como Jesus. Só pensar nisto já é pretensão. Mas a gente vai seguindo a vida, desculpando uma coisinha aqui, morrendo de raiva de outra ali, sempre dentro da condição humana, e isto já é uma dádiva. Estar vivo é uma dádiva. Ter ganhado a vida outra maior ainda. Impossível ser igual aos Mestres, mas dá prá gente fazer uma forcinha e tentar aprender com eles. Namastê.

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