O sal da terra

15 de Abril de 2014
Jornal O Liberal

Jornal O Liberal

*Israel Quirino

Está escrito em Mateus, capítulo 5, versículo 13, que Jesus teria dito a seus seguidores: vós sois o sal da terra. Ora, se o sal perde o sabor, para que há de servir?

Nos dias atuais nunca foi tão necessário rever conceitos, reavivar valores esquecidos, desenterrar as lições que nos foram dadas de graça pelas pessoas ilibadas com quem encontramos nessa vida. Reinventar o homem, eis a missão! E o que cabe a nós advogados, operadores do Direito e aqueles que na academia almejam tal distinção? Somos convidados a fazer justiça e como o sal da terra, nos tornamos necessários!

A Constituição de 1988, com a sabedoria do povo nos diz: sois vós, advogados, indispensáveis à administração da justiça (artigo 133). Ora, me pergunto, se o advogado perde a noção do que é reto, como se efetivará a sociedade justa e solidária que a Constituição promete no seu artigo 3º?

A justiça, parafraseando Santo Agostinho, se me perguntarem o que é não saberei responder, mas com certeza sei o que não é. E é com o que não é que devemos nos preocupar. Se nos dispusemos a trabalhar para construir uma sociedade justa, aspiração coletiva do povo brasileiro e inconsciente de toda humanidade, e se, por força da lei maior, nos tornamos essenciais a esse exercício, resta-nos pedir a Deus que nos dê sabedoria e ponha freios em nossas iniquidades para que possamos dar alma à lei e traduzir em ação na vida corriqueira aquilo que entendemos ser justiça. Não é decorando códigos que se dá vida à lei, mas compreendendo as suas entrelinhas, olhando nos olhos das pessoas que esperam de nós que a justiça se faça.

Há muitos que se impressionam pelos discursos eloquentes dos tribunais, pela linguagem esmerada dos textos jurídicos, pela indumentária elegante dos juristas, pela pompa das cortes, ou pelas possibilidades financeiras, as reverências e salamaleques. Não. Decididamente a justiça não se faz com tais adereços. Antes, os dispensa pela simplicidade do oprimido, pelo desespero do encarcerado, pela dor das vítimas, pela fragilidade do desamparado, pela fome, pelo medo, pela angústia. Não é de aparências que vive a justiça. Aqui, vale de novo uma paráfrase, desta vez recorro a São Paulo para afirmar que a justiça não se ensoberbece, não vocifera, não grita. É mansa e prudente. Quando ela acontece, ainda que em silêncio, todos a percebemos. É como um bálsamo, um fino perfume. Tudo o que vier além é pirotecnia desnecessária.

Na verdade, a sociedade justa que almejamos precisa muito do advogado-conselheiro, equilibrado, estudioso, que fala língua de gente, que conhece as dificuldades das pessoas e se dispõe a ser serviço. Com facilidade troca-se a gritaria, o estardalhaço, a velhacaria pela compreensão, o zelo, a concórdia, a boa fé. Há duas portas para se entrar para história, uma delas é a porta dos fundos, notadamente a mais fácil. A nossa vida é feita de escolhas e, não raro, somos aquilo que escolhemos ser. Do Direito Romano herdamos a máxima que deveria nos direcionar: honest vivere, alterum non laedere, suum cuique tribuere (viver honestamente, não prejudicar a ninguém, dar a cada um o que é seu). Essa é a prática da justiça. Todo o resto é literatura!

*Professor e advogado

Comments powered by Disqus

Newsletter

Acompanhe-nos

Encontre-nos no Facebook