Reforma de araque I

08 de Julho de 2015
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

Nem bem se apagaram as lâmpadas coloridas de fim-de-ano, ou se silenciaram os tamborins (tamborins?) do carnaval, e, eis que já caímos no segundo semestre, prontos para ouvir novamente a cantilena das boas festas, obrigação social pra lá de hipócrita, a grande maioria completamente alienada em relação à origem e sentido da festa. Às contas mal pagas ou não pagas do ano anterior somar-se-ão mais débitos e, ao frenesi momentâneo, sucederá o costumeiro choro e ranger de dentes, eco do arrependimento tardio em relação aos gastos supérfluos.

Enquanto isso, nas sombras, não alcançadas pelos olhos do povo, entretido com o ilusório, figuras de sempre se movimentam em torno de quem e do como deva assaltar a mesa onde está o queijo. É que se aproxima o período mágico quando, no Brasil do discurso, tudo se ajeita ou se resolverá, para que o eleitorado não falte com os votos. Na antessala da campanha, governantes preparam o jogo dos feitos de última hora, confiantes na máxima de que “a última impressão é que fica”. E o pior é que a patuleia confirma o dito, babando-se diante de qualquer realização engana-trouxa, que poderia ter sido feita nos primeiros meses, mas, proteladas para os últimos, fazem mais efeito como se grandes obras fossem. Coisas de país educacionalmente atrasado! E de propósito!

O sistema político-eleitoral, viciado e aberto à manipulação, não engana a mais ninguém e até entre menos esclarecidos ouvem-se críticas e repúdio ao ato de votar, como consequência de tantos desacertos, não corrigidos ao longo dos anos, porque eles convêm a políticos que aí estão. É lamentável que o eleitor chegue ao ponto de repudiar o mais sagrado direito dentro da democracia, mas é a reação desesperada dos que não mais acreditam nessa coisa que aí está e não contam com solução a curto ou médio prazo. O eleitorado, cansado, abomina a enganação, rejeita o atual sistema político-eleitoral e buscaria outra saída, se lhe fosse dada oportunidade.

A esperança, para uma minoria, estava na propalada reforma política que, há muito anunciada e sempre postergada, finalmente, entrou em pauta, forçada por fatos deploráveis que mancham a política brasileira. Mas a frustração não tardou, pois pouco ou nada se reforma, de acordo com as últimas votações dentro do Congresso Nacional. Aumentar ou reduzir o tempo do mandato, mudar o dia da posse, alterar a idade mínima para candidatar-se a este ou aquele cargo, não significam nada e em nada melhoram o sistema. A quantidade de partidos, a maioria sem nenhuma expressão, criados por conveniência dos respectivos “caciques”, mais interessados nas benesses de um alinhamento com o governo, é uma das aberrações, cujo reflexo está no número de ministérios, sem quê e nem pra quê. Nada se fez e, infelizmente, nada se fará para reduzir o número de agremiações. Quanto à obrigatoriedade do comparecimento às urnas (voto obrigatório, teoricamente), que contraria o direito de opção, presente nas democracias, também nada se alterou, tendo sido mantida pelos parlamentares com a explicação simplista, porém esperta de que o eleitor, assim, valoriza e participa do processo eleitoral. Defensores da obrigatoriedade, no entanto, esquecem-se de que ela acaba por colocar até eleitor menos crítico, contra o processo, deixando de seguir critérios na escolha dos candidatos. Ele acaba por votar em “qualquer um” ou no indicado por terceiros ou, pior, havendo oportunidade, vende o voto. Na mesma linha, argumenta-se que o voto facultativo favoreceria o clientelismo, pois alguém poderia oferecer vantagens, sabendo que o eleitor compareceria à seção eleitoral; argumento esfarrapado, pois a compra de votos se faz dentro do atual sistema, embora a lei seja mais rígida, atualmente, no combate a tal prática. Na obrigatoriedade do comparecimento à urnas configura-se um acinte ao direito do eleitor e à democracia, depois do golpe maroto do TSE contra o voto nulo, ou seja, a posição política do eleitor diante do sistema, ou a rejeição aos candidatos apresentados.

  • De acordo com o Código Eleitoral vigente (de 1965, sob o dito governo militar): “Art. 224. Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do País nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais ou do Município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias.”. Observe-se que o Código diz nulidade, não fazendo distinção entre voto anulado pela Justiça Eleitoral (fraude e outras irregularidades) e o voto nulo (por erro ou por vontade) dado pelo eleitor. Entretanto, marotice do Tribunal Superior Eleitoral – TSE deu outra interpretação ao artigo. Provocado por político temeroso quanto a possível avalanche de votos nulos, o TSE passou a considerar somente o voto anulado pela Justiça Eleitoral como determinante de nova eleição.
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