Reforma de araque II

14 de Julho de 2015
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

De volta à vaca fria, ou seja, à questão do dever ou direito do voto, no Brasil, pode-se dizer que o cidadão é, realmente, forçado a, pelo menos, comparecer ao local de votação, um contrassenso ao princípio de liberdade, um dos pilares da democracia. Direito têm os políticos de receber os votos e, para que mais direito tenham, mandam às favas o direito dos eleitores, mediante subterfúgios nos quais escoram as leis por eles criadas.

É interessante, aqui, observar um dos argumentos dos defensores do voto obrigatório. Segundo eles, outra consequência negativa do voto facultativo seria a queda da representatividade, pois haveria redução do número de comparecimento às urnas. Por aí se vê que há algo errado no processo eleitoral, a começar do eleitor, deseducado para o exercício da cidadania, por culpa do sistema político, que só tem olhos para o próprio umbigo. E por ter olhos só para o próprio umbigo, ao sistema não interessa uma sociedade formada por cidadãos educados, em todos os sentidos, conscientes de sua cidadania. Se o sistema não fosse a coisa podre que aí está, o cidadão teria orgulho de comparecer e escolher entre os melhores, merecedores do seu voto, sabendo que estaria a entregar os destinos da nação, do seu estado e do seu município a pessoas probas e competentes, fosse qual fosse o resultado das urnas.

É uma falácia dizer que votar, de dois em dois anos, ajuda a ter compromisso com a política e é benéfico à sociedade brasileira. Seria se o sistema político-eleitoral fosse embasado em outros critérios! Ainda com relação à possível queda na representatividade, apontada para o caso do voto facultativo, os defensores do voto obrigatório, quase sempre também contrários ao voto nulo, esquecem-se de que esse tipo de voto, se não considerado na totalização, pode, igualmente, causar queda na representatividade. Continuam a bater na tecla de que o voto nulo é próprio do cidadão apático ou sem compromisso com a política; que assim procedendo, o eleitor renega o sagrado direito de votar e demonstra não ter apreço ao país. Enfim, fazem crer ao eleitor que ele é cidadão de terceira categoria quando, na verdade, ele pode estar mais consciente do que aquele que vota em alguém.

Dessa forma a propaganda contra o voto nulo pode ser qualificada de terrorismo de consciência! Insere-se no mesmo caso do bicho-papão, ser mítico ao qual ignorantes recorrem para coibir travessuras infantis. Ao invés de argumentação positiva com noções de discernimento entre o certo e o errado, pais enchem a cabeça dos filhos com historietas amedrontadoras. Não só podem formar indivíduos medrosos, supersticiosos, incapazes de enfrentar a realidade, como também formam cidadãos, que cumprem a lei, não porque assim deve ser, ainda que injusta a lei, mas por medo de possível punição. A conquista do pretendido, por meio do medo, difere da tortura e do terrorismo físicos apenas no grau de sofrimento imposto à vítima. O que dizem sobre o voto nulo é a mesma coisa, respeitadas as devidas proporções!

Como reforço à campanha de “amedrontamento”, oponentes ao voto nulo dizem ser um mito, ou lenda, a possibilidade de uma eleição ser repetida, no caso de os votos nulos superarem os 50%. De acordo com o Código Eleitoral, artigo 224, em sua origem (1965) essa possibilidade não era mito e nova eleição devia ser convocada dentro do prazo de vinte a quarenta dias. Teoricamente, a possibilidade deixou de existir com a Constituição de 1988 (art. 77 § 2º Será considerado eleito Presidente o candidato que, registrado por partido político, obtiver a maioria absoluta de votos, não computados os em branco e os nulos.) que jogou terra sobre o artigo 224 do Código Eleitoral, ainda vigente.

Diz-se teoricamente, porque em 2004, por exemplo, pelo menos, quatro municípios (Divina Pastora e Nossa Senhora de Lourdes, em Sergipe, Flores de Goiás e Alvorada do Norte, em Goiás) realizaram novas eleições por esse motivo. Teria o artigo 224 do Código Eleitoral continuado sua vigência, se um político, temeroso de perder a eleição, não o tivesse questionado junto ao TSE. Portanto, não era mito ou lenda, era realidade e foi um direito que políticos roubaram do povo O Código Eleitoral, criado pelo regime de exceção era mais democrático que a dita Constituição Cidadã!

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