Terra arrasada: o Congresso Nacional perdeu a moral

05 de Maio de 2017
Jornal O Liberal

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*_Antônio Tuccílio_

Quando me pedem um palpite sobre os eleitos em 2018, eu costumo responder: “Aqueles que não estiverem presos”. Claro que há uma carga de humor negro nessa resposta, mas não deixa de ser provável que até lá possíveis candidatos à Presidência da República, aos governos dos estados e ao Congresso Nacional estejam, de fato, atrás das grades ou pelo menos prestando esclarecimentos à Justiça.

O cenário político do Brasil é, hoje, o de terra arrasada. Não gosto de generalizar, até porque conheço bons representantes do povo e acredito na honestidade de outros, mas o panorama é o de um Congresso Federal sem moral e em quem já não é possível confiar.

Não é de hoje que a reputação do Legislativo e do Executivo estão no fundo do poço. Pior ficou após a divulgação da lista do ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). Ao todo, são oito ministros do governo Michel Temer, mais de um terço do Senado (29 senadores) e 39 deputados federais investigados. Não posso deixar de destacar as delações que implicam políticos de quase todos os partidos. Em um país onde as instituições são mais sólidas, acredito que pelo menos os ministros teriam sido afastados de seus cargos. No Brasil, ao contrário, todos permanecem em suas posições como se nada tivesse acontecido.

Nos últimos meses, temos vivenciado uma série de ações do Congresso Nacional para aprovar emendas, projetos e afins que beneficiam apenas suas Excelências. Uma das mais recentes é a que trata do abuso de autoridade. Não defendo que juízes e promotores não devam ser punidos quando cometem abusos, mas somente alguém muito ingênuo não enxerga nesse projeto uma tentativa clara de barrar a Operação Lava Jato.

Já se falou também em anistia do caixa 2! O projeto das 10 medidas contra a corrupção chegou a ser desfigurado a ponto de incluir o perdão aos políticos que lavaram dinheiro em campanhas passadas. Um projeto que veio do povo e que deveria servir para punição de infratores quase se tornou um bilhete premiado para corruptos. Não foi aprovado em parte porque houve pressão popular para evitar a anistia, motivo pelo qual os deputados começaram, aos poucos, a adotar o discurso do ‘sempre foi assim’, com a clara intenção de institucionalizar um ato que é crime. É muita desfaçatez. Já que não se pode ocultar o crime, porque não torná-lo algo corriqueiro e aceitável? A narrativa é essa.

As reformas em andamento são descabidas. A que trata da Previdência Social felizmente vem perdendo apoio na Câmara dos Deputados. Isso não acontece porque os deputados chegaram à conclusão de que a proposta vai prejudicar a população. O recuo de muitos parlamentares deve-se ao receio de perderam votos nas próximas eleições e, assim, ficarem sem o foro privilegiado.

O texto da reforma já foi alterado em vários pontos, mas isso ainda não é suficiente. A reforma não pode ser defendida porque não existe rombo da Previdência. Em resumo, o governo utiliza esse argumento como desculpa para fazer as mudanças que está propondo, mas a verdade é que não existe déficit e, sim, superávit nas contas da Seguridade Social, da qual a Previdência faz parte. Os dados da Anfip comprovam.

Já a terceirização irrestrita foi aprovada rapidamente. Com isso, as atividades fim podem contar com funcionários terceirizados, inclusive no setor público. Essa situação influencia na diminuição e talvez no fim dos concursos públicos – e principalmente na qualidade dos serviços prestados à população. Serviços terceirizados sempre deixaram a desejar em qualidade. Um projeto como esse pode beneficiar meia dúzia de empresários, já a população será prejudicada. O futuro dirá.

Como se já não bastasse tudo isso, estão sendo discutidos o voto em lista fechada – quando o eleitor vota no partido invés do candidato – e um fundo partidário de mais de R$ 2 bilhões.

O voto em lista fechada visa apenas dar foro privilegiado aos políticos investigados na Lava Jato. Será que você, leitor, acredita que os políticos delatados estarão fora das listas? Pode ter certeza que não. Além disso, os políticos parecem viver em uma realidade paralela na qual as pessoas confiam nos partidos.

O fundo partidário é uma afronta ao eleitor. Afinal, o dinheiro sai dos nossos bolsos. Curioso é que o governo defende as reformas com a desculpa de que o país está quebrado, mas não hesita em sugerir fundo partidário de nove dígitos. É muita incoerência.

Há muito a ser feito e, a meu ver, acabar com o foro privilegiado é essencial. Essa terra arrasada não dará mais frutos enquanto políticos desonestos continuarem em seus cargos, protegidos pela lei e julgados apenas por um STF extremamente lento. Tirá-los do status da impunidade é o primeiro passo para mudar a política para melhor.

*_Presidente da Confederação Nacional dos Servidores Públicos (CNSP)_

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