Xô nome indesejável

05 de Novembro de 2015
Nylton Gomes Batista

Nylton Gomes Batista

O indivíduo, homem ou mulher, chega ao mundo desprovido de tudo; pouco mais que nada, mal e mal capaz de ver e ouvir, embora possante como produtor de muito barulho com ou sem motivo aparente. É criatura destituída de beleza, feia mesmo, malgrado hipocrisia familiar e dos mais chegados a insistir nas exclamações; - Que belezinha! - é muito fofinho(a)! parece com a vovó! Esta última, coitada, especialmente se o rebento é o primeiro de sua segunda geração, sente-se homenageada.

Tudo é riso e festa em torno daquele ser, um pouco indefinido fisicamente, futuro incerto, mesmo com todas as projeções e prognósticos de seu mundinho à volta. Seu primeiro bem, imperecível, ele ou ela recebe no Registro Civil, confirmado com o Batismo, se de família religiosa, ainda que por apenas tradição. E é aí que a porca torce o rabo, pela primeira vez, para aquela pessoinha, se bem que só mais tarde se torne disso consciente.

Esquecendo-se de que o prenome, conforme já dito, é um bem pessoal, intangível, porém de vital importância para o indivíduo recém-chegado a esta nave espaço-cósmica, muitos pais pensam, antes de tudo, numa homenagem a si próprios como baba-ovos de alguma personalidade do mundo do futebol, da televisão, das novelas, do cinema e até da política. Quando não os pais, algum enxerido do círculo mais íntimo assopra algo duvidoso, imediatamente aceito e confirmado como nome do coitado, já infeliz, mas disso ainda não sabe. Só saberá e sentirá mais tarde quando, entre colegas de escola, virar alvo de chacotas, (o moderno bullying). Quando estrangeiro, portanto estranho à cultura local, o nome é mal pronunciado, gerando mais distorções no relacionamento externo, mas, em casa, arranjam-lhe um apelido afetivo com o qual tentar esconder o verdadeiro nome, que o “aquinhoado” já considera uma anomalia. Quanto aos nomes bem aceitos também não se pode dizer que assim são porque os pais, por si só, acertaram na escolha, mas por pura sorte de seus portadores, como numa grande loteria. Não dá para saber, de antemão, o gosto do futuro galalau. Pelo menos nesse aspecto, este autor se considera grande premiado na loteria!

Se não dá para adivinhar, pelo menos bom senso deveria haver na escolha do nome, pois, este constitui a coluna em torno da qual se formará a personalidade do seu portador. É seu patrimônio pessoal, imaterial, com o qual deve harmonizar-se sua natureza psicológica, para que viva em paz consigo mesmo e com o mundo que o rodeia.

Essas considerações se fazem motivadas por recente decisão judicial, em Goiânia, onde um desembargador autorizou a troca do prenome de uma mulher, que se sentia diminuída e envergonhada com o nome, a ponto de escondê-lo quando podia, embora este não fosse incomum ou ridículo. Com relação à sua decisão, o magistrado disse que “o prenome ................ trazia para ela uma infelicidade tão grande, que fiquei sensível e autorizei a mudança. Nós viemos ao mundo para ser felizes. Isso é uma obrigação”. A autora teve sorte de encontrar, nos caminhos da Justiça, profissionais sensíveis à angústia de quem tem, no próprio nome, um fardo do qual deve ser aliviado. Assim terminou a luta de quatro anos, enfrentada por uma recepcionista de quarenta e quatro anos. Mas, isso não acontece todo o dia, pois a grande maioria não sabe e nem tem recursos financeiros, para contratar um bom advogado e recorrer à Justiça; e, os que recorrem nem sempre conseguem pois sensibilidade não é comum a todos os magistrados. Assim sendo, um grande número de pessoas segue suas vidas, como vítimas de chacotas, insatisfeitas, constrangidas diante de circunstâncias decorrentes de nomes inadequados.

Essa angústia enfrentada por tantos cidadãos poderia amenizada, pelo menos, a tempo de o indivíduo assumir condição plena de cidadania. Isso seria possível, se as pessoas em cargos chaves da administração pública olhassem um pouco além do seu tempo e, com base na tecnologia já disponível, abrissem possibilidade de qualquer cidadão se livrar de nome, eventualmente, indesejável. Bastaria que, no registro de nascimento, o prenome constasse como provisório até o alcance da maioridade, ou seja, quando o indivíduo assume suas responsabilidades como cidadão. No mesmo registro reservar-se-ia espaço para o nome definitivo, que o cidadão informaria ao Registro Civil, consciente de que essa seria sua única oportunidade de troca do próprio nome e reemissão dos demais documentos, de forma definitiva. Para qualquer consulta e conferência futuras, o Registro Civil conservaria também o prenome original.

– Ah!, mas, isso não é feito em nenhum lugar do mundo! – dirão. E daí? Pioneirismo a bem do todo faz mal a quem?

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